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25 de dezembro

Bartyra Soares
Membro da Academia Pernambucana de Letras

Publicado em: 25/12/2019 09:00 Atualizado em:

À memória de meu pai Pelópidas Soares

Intensa chuva escorre pela minha face. Que estação vivencio nestes minutos que sinalizam os ponteiros agora? No terrestre calendário de Deus, à beira do Atlântico Sul, no Recife, flui o verão e, no entanto, sinto viver o inverno.

Um inverno atípico, de imprecisa cor, próprio do Hemisfério Norte, quando nesta época do ano, papais noéis agasalhados, renas, trenós e neve atapetando o solo de um molhado branco de paz, se justificam.

Um inverno de chuvas ininterruptas.

Meu coração pulsa de saudade de meu pai. Saudade do amor que incondicionalmente me ofertou. Saudade da presença, do beijo, da palavra, do silêncio que tantas vezes muito me falou. Daí o ocorrer, em mim, a inevitável troca da estação.

Nesta hora, sinos em compasso de aleluia repicam pela chegada do Menino no sagrado ritual da existência.

Ventos do oeste, do leste, do sul, do norte contracenam com o fremir da natureza e todo o reino vegetal inclina-se num reverente reconhecimento deste mágico instante.

Rios levam na correnteza a festa da Natividade e ondas dançam nas praias com seus corações liquefeitos, azuis, palpitando, palpitando.

A grande estrela, os pastores, os anjos, os Reis Magos, os animais exaltam a vinda do Menino e a manjedoura oferece-lhe o colo acolhedor. É Vida que se faz Vida. José e Maria estão prenhes de amor.

Nesta noite o Mar Morto conta histórias consagradas do Homem e se faz revigorante água viva.

Homens, mulheres e crianças sorriem na solidária contemplação deste mistério.

E eu, apesar da chuva deste inverno, apesar destes pés cansados de atravessarem charcos, de pisarem em fosca realidade, de percorrerem estradas escorregadias, também a Tua chegada louvo, Menino, Mestre das parábolas, que já atravessam dois milênios e te tornam Senhor dos espaços que se entrecruzam, tornando irmãos aqueles que Te aceitam e Te reverenciam.

Louvo-Te por teres me ensinado que bem-aventurados são os que choram de saudade, porque um dia souberam valorizar a dimensão do amor.

Louvo-TE, a ti, Menino, por trazeres neste momento para o meu coração o milagre da vida de meu pai que se renova em mim, fazendo cessar a chuva deste inverno de saudade, que há pouco se derramava infindável e que, agora, não mais passa de uma repentina, luminosa e insondável noite de Natal.

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