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O sentido do poder

José Luiz Delgado
Professor de Direito da UFPE
opiniao.pe@diariodepernambuco.com.br

Publicado em: 19/11/2019 03:00 Atualizado em: 19/11/2019 09:45

Inigualável líder das oposições, acusado de sistemático e implacável destruidor, Carlos Lacerda surpreendeu no Executivo, mostrando-se realizador igualmente notável, hoje considerado o melhor governador de todos os tempos da história do Rio de Janeiro. Sua concepção do poder, por isto, não é apenas teórica, mas resultado de intensa vivência. Dizia ele que “o poder não é cargo de sacrifício; é fonte maravilhosa de alegria”. “Ser governo não é um sistema de privilégio para você; é uma forma quase de escravidão, pelo menos de servidão. É uma doação”. “O poder exercido com o senso de servir é a coisa mais gloriosa que pode haver”. “O poder bem exercido é extremamente gratificante – bem exercido, quero dizer, com o sentido de servir, com o sentido de doação, de uma entrega absoluta a um dever”. “Esse poder dá uma sensação de realização maravilhosa”. Poder, portanto, usado para o bem. Como serviço à cidade dos homens. E, usado para o bem, é instrumento insuperável.

Muitas vezes, no entanto, o poder é usado para o mal – para proveito próprio, para o egoísmo, para corrupção. Assim vinha sendo praticado no Brasil, e de forma tão sistemática, tão constante, tão reiterada, por governos de um lado e de outro, que já estávamos acostumados, quase chegando a pensar que não havia outro jeito nem solução. O resultado era o nojo nacional e generalizado pela política.

Mas o sensacional, no poder, é que ele pode também ser usado para o bem. Para isso são fundamentais algumas qualidades – a paciência, por exemplo, certa capacidade de articulação, certa vocação para congregar, sobretudo a autenticidade, a simplicidade, a transparência, a disposição de falar claro e direto para o povo. Nunca há que perder de vista o norte a ser procurado, é claro, o objetivo público honesto que pregou, pelo qual foi eleito, e que sinceramente persegue. Mas tudo, as grandes mudanças, não precisa ser feito ao mesmo tempo e de uma só vez, nem abruptamente, nem atropelando rotinas e instituições. Para usar o poder para o bem é indispensável a ciência da oportunidade, do tempo, dos modos. O poder há que ser exercido com paciência. Saber, getulianamente, dar tempo ao tempo. O Supremo, por exemplo, anda tomando decisões péssimas e não é confiável? Mas há a sabedoria do tempo! Basta esperar um pouco. Em breve dois ministros se aposentarão, pela compulsória, e o governo poderá nomear outros – e aí a maioria do Supremo se inverterá.

É preciso congregar e somar. Não se perder em intrigas e brigas menores, mas advertir-se do muito que têm – a saber, o poder, a vantagem insuperável do poder, esse magnífico instrumento, que pode, sim, ser exercido para o bem.

E não dar muita importância a essas reclamações cotidianas, repetitivas, que não perdoam nada e parecem mais uma fúria, obsessão doentia de superdimensionar a menor deficiência e omitir qualquer mérito. São apenas manifestações de desespero daqueles que perderam o poder. No fundo, as reclamações que tantos verbalizam são apenas pretextos: de fato, não se incomodam com elas – com Amazônia, com saúde, com índios, com coisa alguma. Estão é loucos por terem perdido o poder – o poder que usavam tão mal, o poder das mamatas, dos privilégios, dos superfaturamentos, dos enriquecimentos ilícitos, da corrupção, da traição nacional.

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