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Editorial Sínodo da Amazônia

Publicado em: 07/10/2019 03:00 Atualizado em: 07/10/2019 10:08

Começou ontem, em Roma, o Sínodo da Amazônia. Planejada há dois anos, a assembleia episcopal reveste-se de inédita atualidade. De um lado, debaterá temas espinhosos para a instituição. Entre eles, o celibato dos padres e o papel da mulher na tomada de decisões no seio da Igreja. De outro, discutirá assuntos externos. É o caso dos direitos indígenas e do papel da maior floresta tropical do mundo no contexto global.

A preocupação de Francisco com o meio ambiente é antiga. Em 2007, o então cardeal Jorge Mario Bergoglio já tratava abertamente da questão. No Vaticano, o interesse ganhou relevância e tomou corpo teológico na encíclica Laudato Si, na qual reivindica o ambientalismo integral — ecologia que abrace também a dimensão humana e social levando em conta a essência do homem.

Em muitas abordagens, a posição do Vaticano contraria a do presidente Jair Bolsonaro, que vê nelas ingerência na soberania nacional. A respeito, o cardeal Cláudio Hummes, presidente da Rede Eclesiástica Pan-Amazônica (Repam) e participante do encontro, frisou: “Respeitamos a soberania do Brasil, mas a Igreja também está na Amazônia”.

O encontro, vale lembrar, é anterior à crise ambiental protagonizada pelo Planalto. Mas terá o potencial de devolver a questão novamente às manchetes. Gestado em Puerto Maldonado, no Peru, quando o papa visitou Lima e Santiago em janeiro de 2018, o evento apontava para outro foco — os novos caminhos de evangelização nos confins do território verde que se estende por sete países.

Não por acaso o Sínodo tem o nome da região. Segundo o Instrumento de Trabalho — o documento inicial de criação do evento —, a Amazônia tem especificidades que impõem um olhar diferenciado na ação católica: as imensas distâncias, a escassez crônica de sacerdotes e a importância das comunidades indígenas e sua cultura.

Possíveis soluções serão postas sobre a mesa. Entre elas, o estabelecimento de maior aproximação da fé católica com a das populações locais e o ensino da teologia tradicional indígena aos seminaristas da região. Também figurará nas considerações a incorporação de músicas, danças e idiomas indígenas na liturgia da missa.

Duas propostas devem desagradar ao prelado ultraconservador. Uma delas: o fim do celibato dos padres. A ordenação obedecerá a requisitos — pessoa idosa, de preferência indígena, respeitada e reconhecida pela comunidade mesmo que já tenha constituído família. A outra: o tipo de ministério oficial que pode ser conferido à mulher em razão do papel central que desempenha na igreja amazônica.

Até 26 de outubro, quando se encerra o Sínodo da Amazônia, debates darão mais visibilidade ao assunto e aos demais temas da agenda. A assembleia servirá de laboratório. Talvez defina o papel da igreja no século 21 ao encarar desafios incômodos tantas vezes adiados e de consequências  imprevisíveis.

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