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Comércio digital e crise no varejo

Alexandre Rands
Economista, PhD pela Universidade de Illinois e presidente do Diario de Pernambuco

Publicado em: 03/08/2019 03:00 Atualizado em: 05/08/2019 10:20

Apesar da maioria das compras serem realizadas ainda nas lojas físicas, com interação entre vendedores e consumidores, há uma tendência forte à substituição desse tipo de aquisição de bens de consumo por aquela consumada pela internet. Ambas as formas, digital e física, possuem suas vantagens. A física permite a melhor checagem das características do bem adquirido, a maior agilidade na recepção do bem adquirido, e maior segurança no pagamento. A compra digital, por sua vez, permite que ela seja realizada de forma às vezes mais rápida, sem envolver deslocamento para a loja, além de facilmente proporcionar melhores preços. A disseminação do hábito de comprar pela internet está afetando bastante o comércio. A crise que ele passa está sendo acentuada por essa competição. O número elevado de lojas fechadas é na sua maior parte decorrente da crise por que passa o país. Entretanto, esse número está mais elevado pela mudança dos hábitos de compra.

Entre 2003 e 2018, a proporção entre receitas do varejo ampliado para o PIB do comércio no Brasil caiu para 61% do seu valor inicial (baseado em dados do IBGE). Obviamente, no PIB do comércio inclui-se muitas atividades que não são do comércio varejista e as receitas podem ter sido apertadas proporcionalmente pela maior concorrência neste segmento em momento de crise. O fato do emprego ser um indicador relevante para o cálculo do PIB do setor e esse não encolher na mesma proporção do que as margens vezes o volume de vendas, leva à queda menor no PIB. Isso em si também explica uma parte da redução na proporção das receitas para o PIB. Contudo, certamente o efeito na proporção dessas duas correções necessárias (restrição do indicador apenas para o comércio varejista e forma de medir o PIB) não justifica toda a queda verificada. Houve sim, uma redução grande na proporção das compras no varejo físico.

Desde 2016 essa proporção tem se estabilizado um pouco. Mas ainda assim, a tendência para os próximos anos será de maior queda, pois as tecnologias de vendas na internet ainda estão evoluindo muito. A proporção de pessoas que confiam nos métodos de pagamentos pela internet também continua a aumentar. Ou seja, a redução na queda do avanço do comércio digital nos últimos dois anos ainda não deverá representar o fim da mudança na proporção. Essa queda ainda deve voltar a acelerar nos próximos anos. O varejo presencial terá que se adaptar a esse novo mercado e com isso tentar frear esse seu encolhimento. Vale lembrar que na Europa e Estados Unidos a proporção de compras pela internet estão em patamares bem superiores ao que se verifica no Brasil. Essa constatação é uma indicação de que o alívio da queda verificada deve ser apenas temporário. Ainda não estamos diante de uma estabilização da mudança comportamental.

Muitos segmentos do comércio presencial já perceberam que precisam competir com os preços de produtos similares ofertados na internet. No entanto, a necessidade de cadeias transacionais mais longas e a existência de custos elevados de loja dificultam essa competição. Certamente a redução dos números de vendedores nas lojas e a simplificação dos processos de pagamentos, com introdução de tecnologias sofisticadas, pode aumentar a competitividade. Uma outra consequência dessa tendência será a queda dos custos do espaço de lojas. Shopping centers e proprietários de imóveis em ruas comerciais terão que pagar parte dessa conta. Seus preços deverão cair se não quiserem ver seus clientes entrarem em colapso e deixá-los com espaços vazios.

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