Diario de Pernambuco
Busca
Editorial A César o que é de César

Publicado em: 20/08/2019 03:00 Atualizado em: 20/08/2019 06:28

“Palavra e pedra solta não têm volta”, ensina Benito Pérez Galdós. A frase do romancista espanhol recomenda cautela e chama a atenção para pormenor importante. A pessoa é dona da fala enquanto não a profere. No momento em que a socializa, perde o poder. O discurso torna-se propriedade de quem dele se apodera, que, vale lembrar, não traduz necessariamente o significado original.

Por essa razão costuma-se dizer que o texto tem tantos autores quantos o leem. E outras tantas interpretações. Voltar atrás ou afirmar que não teve esta ou aquela intenção não apaga o já enunciado. Será outro discurso, passível de outros tantos entendimentos. Daí por que oradores preferem não correr risco — escrevem a mensagem. E só a enunciam depois de lida, relida e avaliada a repercussão de cada vocábulo, de cada pausa, de cada gesto.

A observação vem a propósito da repercussão de declarações do presidente Jair Bolsonaro no âmbito internacional. Nas últimas semanas, com seu jeito franco e espontâneo de se expressar, Bolsonaro se pronunciou sobre temas sensíveis como a indicação do filho para a Embaixada do Brasil nos Estados Unidos, as eleições na Argentina, o papel da Alemanha e da Noruega no tocante à política relacionada à floresta amazônica.

Trata-se, como se vê, de assuntos relacionados ao Ministério das Relações Exteriores (MRE). O Itamaraty conta com quadros treinados para falar a língua que agrega, que contorna obstáculos e evita confrontos evitáveis. É uma língua técnica como a dos advogados, dos médicos e dos engenheiros. Não por acaso os diplomatas brasileiros frequentam o Instituto Rio Branco, onde aprendem o jeito diplomático de dizer.

Há mais de meio século a casa de Rio Branco forma profissionais respeitados no mundo inteiro e, por isso, transitam com desenvoltura por diferentes regimes e sistemas. Nada mais sensato para evitar arestas e fissuras na referência a temas internacionais controversos, sensíveis ou polêmicos do que recorrer a especialistas no assunto. É o que se faz no dia a dia. Quem está com febre procura o médico; com dor de dente, o dentista; com o carro enguiçado, o mecânico. Em bom português: dá-se a César o que é de César.

No concerto das nações ocorre o mesmo. Isolar-se é perigoso. A anunciada estagnação econômica mundial afetará o Brasil de forma dramática porque a economia ainda não retomou o esperado impulso do crescimento. É importante manter os parceiros tradicionais e buscar novos para compensar a possível retração. Abrir mão de mercados é fazer gol contra. Ou dar tiro no pé. Doze milhões de desempregados esperam um aceno de esperança. Impõe-se prestar atenção às estatísticas. Atrás dos números, encontram-se pessoas — crianças e adultos que precisam tomar o café da manhã, almoçar e jantar.

MAIS NOTÍCIAS DO CANAL