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Para superar o populismo

Maurício Rands
Advogado formado pela FDR da UFPE, PhD pela Universidade Oxford
twitter: @RandsMauricio

Publicado em: 22/07/2019 03:00 Atualizado em: 22/07/2019 09:17

Yascha Mounk, das Universidades Harvard e Johns Hopkins, em seu livro The People vs Democracy (2018), analisa os riscos do populismo para a democracia e as liberdades. As práticas de Trump, Narendara Modi, Jaroslaw Kacynski, Orban, Erdogan e Putin trazem em comum o descaso para com as regras do jogo democrático-liberal. O fácil apelo às pseudossoluções e à demonização do adversário.  Além do uso da mentira como método de governo.

Para ele, não mais estariam postas as três condições que permitiram a estabilidade das democracias. Que podem assim ser resumidas: i) a mídia tradicional de massa, com sua concentração e formalização, funcionava como gatekeeper contra as ideais extremistas ao criar um conjunto de fatos e valores compartilhados e controláveis pelo Poder Judiciário; ii) a rápida melhoria nas condições de vida dos povos alimentou esperanças de um futuro ainda melhor; e,  iii) prevalência ou hegemonia de um único grupo étnico na maioria dos estados nacionais.  

Endereçando a deterioração dessas três condições básicas, Mounk avança uma agenda com o objetivo de garantir que as democracias liberais correspondam às expectativas dos cidadãos. Para a primeira questão, a da superação da mídia tradicional pela disrupção da internet, ele defende a criação de um ambiente de combate às fake news e às mensagens de ódio e discriminação. Que se promovam modelos de autorregulação. Que os indivíduos e a sociedade civil organizada façam a sua parte. E que se exija que as plataformas gigantes, como Facebook e Twitter, façam mais para barrar as fake news e as mensagens de ódio. Que elas se tornem mais responsáveis, inclusive perante órgãos estatais de aplicação da lei. Há que promover uma nova cultura cívica no ambiente da internet. Para a segunda questão, a da estagnação das condições de vida dos perdedores da globalização, aponta a necessidade de inclusão mediante políticas de redução da pobreza e da desigualdade. Mas com projetos sólidos, factíveis e convincentes. Em áreas como tributação, produtividade, habitação, educação e saúde. Criando um estado de bem-estar social renovado, com benefícios universais não necessariamente vinculados ao emprego tradicional. E, finalmente, a questão do desconforto de certos grupos étnicos que hoje se ressentem da perda da hegemonia étnica. Para que o populismo não continue a explorar esses ressentimentos, cumpre fomentar uma revolução na atitude diante de imigrantes e minorias. Valorizando a cultura da diversidade e promovendo a real inclusão de todas as minorias. Criando um conceito comum de nação, com sociedades verdadeiramente multiétnicas. Uma nova concepção de nacionalismo fundado na diversidade étnica, comportamental e religiosa. Um nacionalismo inclusivo.

A seu turno, a revista The Economist (edição de 6/7/19) faz um alerta sobre os riscos do populismo de direita. Avança a hipótese de que o mundo começa a sentir falta de alguns consensos básicos sobre as regras do jogo democrático. Lembra que tanto o conservadorismo tradicional quanto o progressismo liberal tinham em comum o respeito a certos pressupostos do estado de direito e às regras do jogo democrático. Ainda que sob diferentes enfoques. A ultrapassagem desses limites pelos líderes da onda populista coloca em risco todo um edifício civilizatório de valores e instituições.

As reflexões de Mounk e da Economist apontam caminhos para superar a onda populista ao sugerir possíveis consensos entre o conservadorismo e o progressismo no esforço para endereçar as raízes do desencanto que gerou o populismo. Para os que preferem as sociedades abertas, fundadas em consensos civilizatórios de democracia e liberdade, chegou a hora de superar as condições que permitiram a degenerescência populista. Alguns roteiros começam a ser debatidos e explorados. Como os sugeridos por Mounk e pela Economist.

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