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Euphonio e frevo de bloco: beleza nas ruas do Recife

Luzilá Gonçalves Ferreira
Doutora em Letras pela Universidade de Paris VII e membro da Academia Pernambucana de Letras

Publicado em: 02/07/2019 03:00 Atualizado em: 02/07/2019 16:34

A maioria do auditório, imagino, nunca tinha ouvido falar e só uma parte das pessoas tinha visto o instrumento: uma espécie de tuba, só que menor, o dicionário dizia: um certo harmônio. Assinalava adjetivos correspondentes: eufônico suave melodioso. E um substantivo: eufonia, querendo significar som agradável ao ouvido, elegância e suavidade na pronúncia. E aí entra o músico, jovem, um tanto tímido. E Rachel Casado, talentosa pianista que o acompanharia nos apresenta Caio César da Silva, convidado a estudar na Suíça. Rachel faz um simpático pedido: uma ajuda financeira seria bem vinda, o público dará uma mãozinha e a gente diz, atenção poderes públicos. Mas, enfim, Caio apresenta o instrumento, toca maravilhosamente, música clássica, arranjos e criação de Claudio Santoro, maestro de fama internacional, vejam currículo no Google, que foi professor na Universidade de Brasília, um desses enormes talentos que o país produz. Ouvimos o Luar de meu Bem, o primeiro movimento do Concerto para Eufônio, de Philip Wilby, um frevo do Maestro Duda e o inesquecível Granada de Agustin Lara. Nesse  repertório eclético, a sensível interpretação das melodias nos faz esquecer o mundo lá fora. Como te agradecer Caio, essa tua aposta na beleza? Na segunda parte do programa de Música na APL, domingo passado, o recital da Orquestra e Coral Levino Ferreira, com direção do maestro Lúcio Sócrates, nos fez percorrer as ruas do Recife, em suas manhãs de sol, como o queria J. Michiles (atenção, Carlos Amaral acaba de publicar pela Cepe, a biografia desse músico tão pernambucano), ou no Recife Iluminado do maestro Forró. Um ar de nostalgia em tudo, desde os títulos: Saudosos Carnavais, de Dimison Cesar e Mariinha Leão, Flabelo de Ilusões, de Heleno Ramalho, A dor de uma saudade de Edgar Moraes, o Último regresso de Getúlio Cavalcante, as Alegorias de Claudio Almeida e Humberto Vieira. Vibração na extraordinária interpretação da orquestra, e a gente se pergunta como  vivem de música esses mais que talentosos artistas numa cidade que só os lembra por ocasião do carnaval?  Perdoem a digressão. Lindas e afinadas vozes femininas e as fantasias belíssimas, coloridas, criativas, acompanhavam a orquestra. A presença dos compositores foi uma alegria a mais. E para concluir, com chave de ouro, esse homem dos sete instrumentos, como se dizia antigamente, Valmir Chagas, o irreverente e amado Véio Mangaba, nos apresentou uma incrível releitura de nosso genial Noel Rosa: Último desejo, que qualquer pessoa que já amou não pode escutar sem se comover: mas em ritmo de frevo, num arranjo dele, Walmir e de Claudio Almeida. Emoção redobrada. Nota: antes de enviar este artigo para a redação,  reli todo o texto a me espantei com a quantidade de adjetivos de louvação. Mas que querem? a tarde do domingo passado na APL foi mesmo cheia de criatividade, de gente linda, talentosa, genial, pernambucaníssima. 

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