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Desigualdades regionais e reforma da Previdência

Alexandre Rands Barros
Economista, PhD pela Universidade de Illinois e presidente do Diario de Pernambuco

Publicado em: 06/07/2019 03:00 Atualizado em: 08/07/2019 09:12

As desigualdades regionais no Brasil continuam persistentes, apesar de todas as políticas para revertê-las ao longo dos últimos 60 anos. Em 2016, último ano com dados do IBGE disponíveis, o PIB per capita regional no Nordeste atingiu apenas 51,9% de seu valor nacional. Desde 1939, primeiro ano com dados disponíveis, essa proporção oscila entre 37% e 52%. O Bolsa Família, o BPC e os fundos FUNDEF e FUNDEB trouxeram-no para os patamares atuais, ligeiramente acima da média histórica. Em dois livros sobre o tema, argumento que somente o investimento maciço em educação nas regiões mais pobres poderia revertê-la. Políticas setoriais ou de subsídios empresariais teriam pouco ou nenhum impacto. Seriam apenas formas de transferir dinheiro para empresários específicos. Isso não quer dizer que políticas públicas que não sejam da área de educação não possam afetar as desigualdades regionais. A reforma da Previdência é uma delas, com esse potencial.

A reforma da Previdência é essencialmente uma forma de reduzir as desigualdades de renda no Brasil. Ela retira parte do ônus previdenciário do orçamento geral da União e coloca nos ombros dos que receberão maior benefício previdenciário. Uma política justa, já que os maiores beneficiários são exatamente aqueles que sempre receberam mais do setor público. No Nordeste, a prática de Robin Hood ao contrário (transferência de renda para os mais ricos) sempre fez parte das políticas públicas desde a era colonial. Salários altos do funcionalismo de alto escalão sempre foi um método altamente utilizado nessa prática. Ela tem sido complementada com aposentadorias também elevadas e sem justificativas a partir das contribuições ao longo da vida. Os governadores atuais tentam preservar essa prática, até mesmo porque geralmente fazem parte dos grupos privilegiados. Não conseguindo manter os privilégios pagos com recursos federais, tentam ao menos mantê-los nos seus próprios estados. Com isso, excluindo estados e municípios da reforma da Previdência com vistas a preservar os interesses particulares próprios e de seus familiares e amigos mais próximos, deverão promover ainda mais as desigualdades regionais.

O mecanismo perverso para as desigualdades regionais seria o seguinte: com estados e municípios fora da reforma aprovada no congresso nacional, aqueles localizados no Sul e Sudeste, as regiões mais ricas do Brasil, rapidamente aprovarão reformas semelhantes à nacional para os seus funcionários públicos. Isso ocorrerá porque nessas regiões os governadores e prefeitos já apoiam a reforma atual e a maior parte dos amigos e familiares deles não vivem pendurada no setor público. Com isso, eles criarão uma dinâmica de longo prazo para os seus equilíbrios fiscais que permitirá a retomada dos investimentos, inclusive em educação. Além disso, eles conseguirão mais facilmente satisfazer as condições para qualificar para o chamado Plano Mansueto. Isso também ajudará no alívio fiscal desses estados e municípios. Já no Nordeste, região mais pobre do país, os governadores e prefeitos não terão facilidade em aprovar reformas da Previdência que assegurem uma perspectiva de equilíbrio fiscal de longo prazo, pois combateram muito a reforma federal de forma populista e irresponsável. Consequentemente, eles não conseguirão manter os gastos em educação nos níveis necessários para assegurar a qualidade da educação semelhante ao que vai se verificar nos estados mais ricos. A consequência é que para beneficiar o alto escalão dos funcionários públicos locais, tentando bloquear a reforma da Previdência, contribuirão para a manutenção e até mesmo aumento das desigualdades regionais. Ou seja, o populismo barato e inconsequente, que esconde interesses das pessoas que os cercam, vai gerar uma conta grande para a população pobre do Nordeste.

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