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Como um garoto prodígio da matemática virou inspiração em Quixaba, no Sertão

Premiado sete vezes na Olimpíada Brasileira de Matemática das Escolas Públicas, o pernambucano João Lucas Gambarra é referência para estudantes de cidade em que a matemática alimenta sonhos

João Lucas ganhou intimidade com os números na infância, apostando memorizar placas de carro em troca de sorvete. Foto: Rafael Martins/DP

O pernambucano João Lucas Lopes Gambarra, de 22 anos, não tem sossego nos corredores da Escola Estadual Tomé Francisco da Silva, em Lagoa da Cruz, distrito de Quixaba, no Sertão de Pernambuco. Ganhou sete medalhas nas sete vezes em que participou da Olimpíada Brasileira de Matemática das Escolas Públicas (Obmep) e, com as premiações, veio a fama entre os moradores da região. Nascido em Serra Talhada, a 75 km de Quixaba, João concilia o estudo universitário com visitas à família e à escola sempre que pode. É quando os meninos mais novos lhe procuram pedindo conselhos, mostrando cadernos, repercutindo provas. João é uma espécie de ídolo: “Se eu consegui as medalhas, eles sabem que podem conseguir também”, resume.

Não fosse o incentivo dos professores na escola estadual, hoje reconhecida nacionalmente como referência no ensino de matemática, com professores e alunos premiados por seu desempenho, a história seria outra. Com 1,94m de altura e um perfil afiado para a competição, João Lucas poderia ser um bom jogador de vôlei ou basquete. Mas ele consegue, sem dificuldade, apontar o momento em que os clichês caíram por terra: encorajado na sala de aula, competiu pela primeira vez na Obmep em 2005, quando recebeu uma medalha de prata - e decidiu, assim que pendurou o “troféu” no pescoço, que repetiria a disputa em busca de um ouro. Dali em diante, foram cinco ouros (2006, 2007, 2008, 2010 e 2011) e um bronze (2009) para a estante de casa - onde era incentivado a “crescer na vida” pelos pais, a advogada Lucineide Gambarra e o sindicalista e professor Lourival Gambarra. Se os planos vingarem, os próximos anos serão dedicados a obter os títulos de mestre e doutor.

Certificados das conquistas da escola ficam exibidos na parede da instituição. Foto: Rafael Martins/DP

“Exemplos como o de João Lucas são importantíssimos para mostrar aos meninos que eles são capazes. Temos aprovados em medicina, engenharia mecânica, engenharia elétrica... É resultado de um trabalho focado de nossa parte e comprometimento da parte deles”, avalia a professora Maria do Bom Conselho Freitas, 41 anos, que deu aula a João durante oito anos. Ela está entre os três professores da escola premiados na Olimpíada Brasileira de Matemática das Escolas Públicas de 2016 pela relevância dos resultados nos últimos 12 anos do exame. A Tomé Francisco recebeu troféu pela trajetória de destaque e teve 32 estudantes premiados na última edição do concurso.

Escola Estadual Tomé Francisco da Silva está entre as 20 instituições públicas mais bem posicionadas do estado no Enem. Foto: Rafael Martins/DP

Para João Lucas, menino prodígio do Sertão pernambucano, a metodologia que lhe garantiu os louros na matemática fez tanta diferença que influenciou uma mudança recente de vida: no oitavo período de engenharia mecânica, trocou o curso pela licenciatura em matemática, na Universidade Federal da Paraíba, em João Pessoa. “Quero ser professor. Minha principal ideia para Quixaba é desenvolver um projeto olímpico, despertar o interesse do pessoal e expandir a 'cultura olímpica' existente. É preciso que os alunos se dediquem não só à Obmep, mas à Olimpíada Nacional em História do Brasil, Olimpíada Brasileira de Astronomia, pela Olimpíada Brasileira de Química, Olimpíada Brasileira de Física, Olimpíada de Língua Portuguesa Escrevendo o Futuro...”, planeja o rapaz.

Essa história daria um livro

Gestor Ivan José Nunes Francisco vai transformar a história da escola em livro. Foto: Rafael Martins/DP

“Os resultados são frutos de uma proposta pedagógica. Aqui, nós não temos aversão à matemática. Passamos isso aos alunos, que vão se apaixonando pela disciplina e se engajam com o projeto, se inscrevem nas olimpíadas, depois se tornam engenheiros, professores, médicos...”, conta Ivan. O primeiro livro já tem título – Aluno autor: escrita premiada – e está em fase de revisão. “É uma forma de estimulá-los, além de registrar a história de êxitos da escola”, avalia o gestor, que recebeu prêmios de referência em gestão escolar (oferecido pelo Conselho Nacional dos Secretários de Educação, o Consed) em 2009, quando foi vice-campeão, e em 2012, quando alcançou o primeiro lugar nacional.

Yan Guilherme já foi medalhista de prata em 2014 e 2016 e fica orgulhoso de dar seguimento à tradição iniciada por João Lucas. Foto: Rafael Martins/DP

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