Melhor por mérito ou por sorteio?

Ingresso de alunos do Colégio de Aplicação de Pernambuco, um dos mais cobiçados do país, pode deixar de ser via concurso

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Postado em 15/10/2015 15:02

Sílvia Bessa /Diário de Pernambuco

Camila Vitória Loureiro passou dois anos preparando-se para se submeter ao disputado concurso para uma vaga no Colégio de Aplicação da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE). Dedicação intensa, privações e muito foco para conseguir o ingresso no 6º ano do ensino fundamental (antiga 5º série) na mais cobiçada escola do estado. A instituição desejada fez e zela pela fama construída: neste ano, por exemplo, foi eleita a melhor entre as escolas públicas do Brasil na prova do Exame Nacional de Ensino Médio (Enem); contando com as privadas, é a segunda em Pernambuco. E 2015 não é atípico. A mesma unidade costuma estar entre melhores e se destacar pela qualidade do ensino oferecido - entre as públicas, é a 4º do país, considerando todas as disciplinas, informa o Ministério da Educação.

Camila, então com dez anos, tinha três horas extras de estudo doméstico para estudar o programa previsto para a prova. O pai, Ricardo Loureiro, um funcionário público que mora com a família no bairro da Várzea, chegava do trabalho e se desdobrava para ver resultados. “Na reta final, ela estudava até cinco horas fora o tempo voltado para o estudo regular e no final de semana mantínhamos a rotina”, conta Ricardo, hoje diretor-conselheiro da Associação de Pais do Colégio Aplicação. Camila foi aprovada ano passado junto com duas dezenas de meninos com menos de 12 anos. Em 2015, preencheram 55 vagas abertas para novos alunos. Mérito deles e das respectivas famílias, que se obstinaram em busca da oportunidade ouro, de uma excelente qualidade de educação a custo zero. Sim, não há qualquer despesa. Os pais costumam doar voluntariamente R$ 100,00 por ano para a Associação e ela contribui para melhoria da estrutura (investiu agora na troca de ar-condicionados quebrados, contam os dirigentes).

Fundado em 1958, o Colégio de Aplicação adota o critério seletivo que põe na mesa apenas os conhecimentos dos meninos e meninas. Hoje só recebe novos alunos por meio de concursos no 6º ano, ocupando vagas para quase duas turmas de 30 alunos. Fantástico, não é mesmo? É chance para qualquer estudante, em tese, chegar lá. Sabendo disso, há quem opte por colocar crianças em cursinhos preparatórios. Mas não é condição única para aprovação. Filhos preparados exclusivamente pelos pais, vide Camila, mostram desempenho louvável (34% das crianças aprovadas nunca fizeram intensivos, indica a pesquisa). Acirrada, a disputa é vista como espécie de vestibulinho (veja a foto de uma das edições).

Pois bem: querem mudar o processo e acabar com o concurso. Uma frase inserida no projeto do Novo Estatuto da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), ao qual o colégio é subordinado, pode mudar a história de sucesso educacional que conduz o Colégio de Aplicação de Pernambuco e o sustenta no topo dos rankings nacionais. Diz assim o artigo nº 112: “O ingresso ao Colégio de Aplicação utilizará política de sorteio”.  Entendo que deixaria de valer o mérito em detrimento do fator sorte.

 “Será a destruição da melhor escola pública de Pernambuco”, crê o vice-presidente da Associação dos Pais do Colégio Aplicação, Cláudio Souza. “O CAp tem 50 anos e é modelo porque tem alunos de todos os lugares e grupos sociais”, explica Cláudio. Segundo a associação, uma pesquisa elaborada pela própria diretoria mostra que o alunado (hoje, 420 no total) é majoritariamente composto por filhos de classe média baixa. De “funcionários públicos, professores, pequenos comerciantes, a maioria com carteira assinada, assalariada”. Uma parcela representativa, cerca de 18%, está desempregada.

Nesta quarta-feira, um grupo de pais terá uma reunião com a diretoria para formalizar o pedido de retirada do artigo nº 112 fundamentando que os alunos foram “alijados da discussão” sobre a proposta de mudança para o ingresso na escola. Esperam que o documento barre a votação do texto do projeto do Novo Estatuto da Universidade de Pernambuco, a ser analisado no dia  28 de outubro pelo Conselho Universitário. Os pais querem ainda a abertura de um fórum “aberto e transparente”, do qual alunos, professores e membros da sociedade civil façam parte. “Há cinco décadas, o Colégio de Aplicação permite uma inclusão social verdadeira”, lembra Ricardo Loureiro, pai de Camila, que fará parte da comissão.
Continuo achando que mérito é mérito e nisso não se deve mexer.

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