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CRÍTICA

'O Homem do Norte': Robert Eggers ritualiza o épico viking em filme brutal

Publicado em: 14/05/2022 18:00 | Atualizado em: 14/05/2022 18:55

 (Filme é baseado no conto que inspirou Shakespeare na criação da clássica tragédia Hamlet. Universal/Divulgação.)
Filme é baseado no conto que inspirou Shakespeare na criação da clássica tragédia Hamlet. Universal/Divulgação.
Nos últimos anos, Robert Eggers passou de ser considerado um nome promissor para se posicionar entre os grandes autores em atividade hoje. Apenas com seus dois primeiros longas-metragens, os aclamados filmes de horror A bruxa (2016) e O farol (2019), o diretor estadunidense já ocupa o seleto grupo de cineastas que têm não somente uma assinatura facilmente reconhecível, mas também um definido projeto de cinema. Em O homem do norte, que entrou em cartaz no Brasil na última quinta-feira (12), tal projeto se concretiza, desta vez, numa escala (só a escala mesmo) de blockbuster.

Baseando-se no conto dinamarquês que inspirou William Shakespeare na criação da tragédia Hamlet, Eggers, também roteirista, trata do jovem príncipe Amleth (interpretado na infância por Oscar Novak e na maturidade por Alexander  Skarsgård), que, em meados do século IX, perto de atingir a maioridade para assumir o trono, tem o pai (Ethan Hawke) assassinado pelo tio (Cleas Bang), que sequestra o reino e a rainha, sua mãe (Nicole Kidman). Após ser ele mesmo marcado de morte, o menino foge para longe, nutrindo ano após ano o desejo de vingança e, disfarçado de escravo numa fazenda para cumprir sua missão, conhece Olga (Anya Taylor-Joy), que se torna na mesma medida cúmplice e paixão. 
 
 (Universal/Divulgação.)
Universal/Divulgação.
 
UM ÉPICO DE AUTOR
 
Ainda que O homem do norte seja orçado em cerca de 90 milhões de dólares - seis vezes mais do que os orçamentos de seus dois primeiros longas juntos -, o apreço pela precisão histórica da direção de arte, o ritmo solene e deliberado, os flertes com um misticismo ancestral e a agressividade do trabalho sonoro continuam sendo marcas registradas do diretor. Sua obsessão em imprimir peso e autenticidade a cada elemento da cenografia é comparável ao perfeccionismo dos seus planos - econômicos em movimentação, frequentemente amplos e cheios de contraste entre luz e sombra. E, mesmo lidando aqui com uma herança clássica de épico viking, Eggers ritualiza as sequências de modo muito particular, fragmentando o filme em capítulos e fazendo cada cena dispor de um caráter épico que tem como fim a própria construção imagética.

 (Universal/Divulgação.)
Universal/Divulgação.
 
Essa intensidade formal de Eggers pode facilmente ser acusada de histrionismo ou vaidade - sobretudo num projeto cujos desdobramentos do enredo já são mais do que familiares e que, consequentemente, detém no seu virtuosismo técnico o principal chamariz. O maior mérito de O homem do norte, no entanto, não está propriamente no visual pomposo ou na verossimilhança da produção, mas na maneira como o cineasta conserva um aspecto sujo e animalesco numa encenação quase teatral.
 
 (Universal/Divulgação.)
Universal/Divulgação.
 
Diferente da esmagadora maioria dos filmes de época contemporâneos da indústria, ele não tem interesse em atualizar os dialetos, dinamizar o tom das interpretações ou inserir senso de humor moderno para tornar seu trabalho mais acessível. A violência varia entre brutalmente objetiva e surpreendentemente explícita; os gestos e olhares são carregados em estilização e as sequências pontuais de embate são cruas e realistas, mas o filme nunca perde a ritualização de sua forma. Pelo contrário: se vale desses apetrechos à disposição justamente para intensificar os seus efeitos estilísticos.  
 
 (Universal/Divulgação.)
Universal/Divulgação.
 
Todo o elenco, composto também por participações pontuais de Willem Dafoe e Björk, se entrega a essa ideia de construção de um universo simultaneamente palpável pela sua veracidade histórica e um tanto alucinógeno pelas suas incursões de horror e fantasia - curiosamente mais presentes até em O homem do norte do que nos filmes dos devidos gêneros que Eggers comandou. 
  
O resultado, apesar de sensorialmente poderoso, talvez seja algo impenetrável para a plateia grande que um filme desse porte supostamente deveria abranger, o que só torna mais admirável um cineasta conseguir em seu terceiro longa concretizar de modo tão cristalino um ideal de autor com um gênero cada vez mais raro - e num sistema mais sufocado do que nunca pela interferência criativa dos algoritmos. 

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