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CARNAVAL

Cariri celebra 100 anos em meio ao vazio das ladeiras e silêncio dos clarins

Publicado em: 12/02/2021 11:20 | Atualizado em: 15/02/2021 16:21

A troça comemora o centenário na próxima segunda-feira (15), recolhida em função da pandemia. (Foto: Hugo Muniz/Divulgação)
A troça comemora o centenário na próxima segunda-feira (15), recolhida em função da pandemia. (Foto: Hugo Muniz/Divulgação)


Blocos de carnaval nascem de encontros: de amigos, cores, músicas e energias. Há 100 anos, um grupo liderado por Augusto Canuto resolveu dar nome e cara à brincadeira que viria a colorir as ladeiras do Sítio Histórico de Olinda nos domingos de folia, abrindo os festejos de Momo. Foi no Mercado de São José, por entre ervas, adereços e materiais para confecção de estandartes, que eles encontraram a pessoa que inspirou o símbolo da Troça Carnavalesca Mista Cariri Olindense. Um homem de longas barbas brancas vestido com roupas de couro e chapéu de cangaceiro com um cajado e um saco de pano nas mãos, que quando perguntado dizia se chamar Cariri. Aquele foi o único contato com a figura emblemática, eternizada por uma fotografia, que deu cor, vida e sentido ao primeiro desfile oficial da agremiação.

Na contramão das expectativas para o centenário, comemorado na próxima segunda-feira, dia 15 de fevereiro, o bloco celebra a data neste ano recolhido, em função da pandemia. Distante dos sorrisos dos incansáveis foliões que o acompanham nos primeiros raios de sol às 4h da manhã, interrompendo pela primeira vez uma jornada sem pausas. Até a live da agremiação, marcada para segunda-feira, às 20h, foi cancelada, em virtude da proibição de eventos virtuais com mais de dez pessoas, decretada pelo governo do estado. O show teria participação da Spok Frevo Orquestra, da cantora Larissa Lisboa e do cordelista Antônio Marinho. Para se manter próxima ao folião, a sede do bloco, no Guadalupe, segue aberta diariamente, das 9h às 19h, com estandarte à disposição para fotografias.

Cariri em 1962 (Foto: Acervo Cariri)
Cariri em 1962 (Foto: Acervo Cariri)
 

“No primeiro momento, o sentimento era de muita tristeza por não poder celebrar este centenário. Até outubro estávamos tristes, mas ao mesmo tempo esperançosos pela vacina. Mas então vimos que precisávamos nos reinventar e encontrar novas formas de se conectar com os foliões”, diz o diretor de comunicação da troça, Hilton Santana, neto do fundador, Augusto Canuto, já falecido. Os organizadores começaram a produzir conteúdos nas redes sociais, através de lives, resgates históricos, recordações e até concurso para definir a camiseta do bloco neste ano.

O Cariri é a troça mais antiga em atividade nas ladeiras de Olinda. Está atrás apenas do Vassourinhas de Olinda, com 109 anos, mas que detém o título de clube. No dia 20 de julho de 2016, o Cariri foi eleito Patrimônio Vivo do Estado de Pernambuco. Três gerações marcam a história da troça, que vem tentando se reinventar, unindo a tradição à nova dinâmica do carnaval pernambucano. “Chegamos aos 100 anos sempre buscando nos reinventar, vivendo o passado no novo. Queremos aproveitar o movimento da turma jovem de valorização às troças, os frevos e os clubes tradicionais”, explica Hilton.

 (Foto: Acervo Cariri)
Foto: Acervo Cariri
É uma fotografia exposta na sede do bloco que guarda as características originais da figura do Cariri que inspirou a troça. “Quando meu avô e os amigos viram aquela figura lá no mercado, logo decidiram que ela ilustraria o bloco. Pediram para tirar uma foto e ela está entre nós até hoje”, relata, lembrando que a inspiração foi apenas estética, mas que há muitas lendas envolvendo a figura. Durante o carnaval, o personagem do Cariri, intepretado por Abílio Filho, desce e sobe as ladeiras em cima de um burro. De acordo com o conto, o personagem, vindo do Sertão, sai às ruas carregando um saco para sequestrar crianças. A narrativa criada é uma brincadeira usada como argumento para os pequeninos não saírem de casa às madrugadas, enquanto o Cariri desfilava nas ruas.

REFORMA
A sede de onde sai a troça atualmente, localizada na Praça Conselheiro Miguel Canuto, no bairro de Guadalupe, no Sítio Histórico de Olinda, foi fundada em 18 de julho de 1992. “O Cariri começou no Amparo, e logo depois meu avô se mudou para Guadalupe, passou anos sendo organizada diretamente da casa do meu tio. A casa era tomada por costureiras, adereços e contava com a presença de toda a comunidade”, conta Hilton.

 (Foto: Acervo Cariri)
Foto: Acervo Cariri

A atual sede foi erguida em um terreno comprado após a contribuição de rifas, bingos e apoio dos moradores da região. “Compraram o terreno e construíram do zero, foram três a quatro anos para ficar pronta”, destaca o diretor. Atualmente, há um projeto arquitetônico sendo desenvolvido para melhorar a infraestrutura do local.

ENTREGA DA CHAVE
Há um ritual que atravessa grande parte da história e atravessa os rumos do Cariri, simbolizada pela chave. Todos os anos, a saída da troça só pode acontecer após a chegada do Homem da Meia-Noite, que encerra seu percurso entregando a chave do carnaval. O bloco do calunga de 89 anos é uma dissidência do Cariri, formado por integrantes insatisfeitos com a gestão da época.

“Uma agremiação também é política. Naquela época, uns que faziam parte do Cariri, e insatisfeitos com o resultado da eleição da diretoria, resolveram não ficar mais na troça, fundando o Homem da Meia-Noite. Decidiram que o bloco sairia antes, abrindo o carnaval. A briga era tão séria que eles não podiam nem se cruzar nas ladeiras”, explica Hilton. Após anos de confronto, a paz foi selada e o Homem da Meia-Noite passou a fazer a entrega da chave, um dos eventos mais simbólicos e marcantes do carnaval pernambucano.



DOCUMENTÁRIO
O legado do Cariri ficará preservado em um documentário que está sendo produzido pelos cineastas Helder Lopes e Paulo de Sá Vieira. Cariri 100 carnavais contará com filmagens recentes, imagens exclusivas de antigos carnavais, registro do cotidiano do Sítio Histórico, entrevistas, intervenções gráficas e cobertura dos preparativos para celebração do centenário. Para finalizar o filme, foi lançada uma campanha de financiamento coletivo para arrecadar a quantia de R$ 22 mil. Até o momento, 70% da meta foi atingida. A contribuição pode ser feita até 19 de março, no site da Benfeitoria (clique aqui).
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