O patrimônio social de Olinda: 40 anos de história

Juliana Barreto
Urbanista e professora de arquitetura do Centro Universitário UNIFBV

Publicado em: 14/06/2019 03:00 Atualizado em: 14/06/2019 09:32

Foi em 1979 o primeiro Encontro em Defesa do Patrimônio Cultural, realizado em Olinda e promovido pelas instituições de preservação, cuja importância se reveste pelo reconhecimento de um inédito e atuante grupo de moradores que ecoava manifestos em favor da preservação do sítio antigo. Sinalizavam as primeiras ameaças à integridade do edificado e os riscos da exploração e do tráfego indisciplinado. Por iniciativa de Aloísio Magalhães, entusiasta da preservação e protagonista na conquista da inscrição de Olinda na Lista do Patrimônio Mundial, da Unesco, esse evento também ocorreu em outros sítios históricos do Brasil, a exemplo de Ouro Preto, Cachoeira, Parati.

A Associação de Moradores e Amigos de Olinda Antiga, fundada pelas arquitetas Vera Milet e a saudosa Maria Alice dos Anjos, marcou presença nas palestras e reuniu esforços na luta pela preservação, com cartazes artísticos, reuniões no Mercado da Ribeira e muita interação social, onde prevaleciam o sentimento de pertencimento e, sobretudo, a defesa da vocação residencial do sítio histórico, singular desde a colonização lusitana. Essa autêntica atitude dos moradores, exemplar em espontaneidade, conquistou-lhe espaço nas diretrizes de atuação da célebre, mas extinta, Fundação Centro de Preservação municipal, marcando pioneiramente o cenário nacional da participação na preservação.

Foi desse entusiasmo embrionário que a associação se transformou na estruturada Sociedade em Defesa da Cidade Alta, conhecida por todos como Sodeca, que ainda sobrevive em Olinda e tem se consagrado pelas constantes disputas com as ações municipais: conquistou projetos, impediu maiores danos ao patrimônio, disciplinou o tráfego, contribuiu na elaboração de leis, instituiu eventos culturais e discutiu os problemas da moradia, em sintonia aos debates internacionais do patrimônio cultural, visto suas lideranças também se acharem associadas a essa matriz cultural.

A brilhante história de luta dos moradores chega aos 40 anos de existência ainda clamando por voz. Assiste-se ao gradual processo de substituição dos usos, cada vez mais incompatíveis com o chamado “espírito do lugar”, como um processo camuflado de expulsão. São verdadeiros signos de resistência que revelam a importância do tecido social tradicional para a memória coletiva. Há ainda muito por fazer em Olinda, mas estes, certamente, escrevem sua página na história e merecem a nossa reverência.

Os comentários abaixo não representam a opinião do jornal Diario de Pernambuco; a responsabilidade é do autor da mensagem.