Editorial Na contramão

Publicado em: 06/06/2019 03:00 Atualizado em: 06/06/2019 10:09

O projeto de lei que propõe mudanças no Código de Trânsito Brasileiro (CTB) acende a luz vermelha na segurança dos que circulam por ruas, avenidas e estradas. O próprio presidente Jair Bolsonaro disse, ao entregar em mão o texto com as alterações ao presidente da Câmara, Rodrigo Maia, que “todo mundo ou é motorista ou anda de uma forma ou de outra em um veículo”.

Faltou incluir os pedestres, também vítimas da irresponsabilidade dos que comandam duas ou quatro rodas em vias urbanas, estaduais ou federais. Eles, além de pagar com a vida ou a invalidez o preço das vias mal-iluminadas, das falhas na sinalização e do desrespeito às faixas a eles destinadas, engordarão as estatísticas do SUS e da perda de vidas.

Há propostas talvez bem-vindas porque facilitam a vida do cidadão, reduzem custos e não oferecem risco à segurança. É o caso de ampliar a validade da carteira nacional de habilitação (CNH) — de cinco para 10 anos e, no caso dos idosos, de três para cinco anos. Mantêm-se, claro, as exigências para a obtenção e a renovação do documento.

Em sentido oposto, causam preocupação as iniciativas que afrouxam a punição aos transgressores. Entre elas, o aumento de 20 para 40 pontos o limite de infrações para a perda da CNH, o fim da multa para quem trafega em rodovias sem os faróis ligados durante o dia, a redução da infração para motociclista sem proteção visual ou para quem transporta passageiros sem capacete.

Mais: apaga o trecho do CTB que prevê cassação da CNH para condutor condenado judicialmente por delito de trânsito, elimina a exigência do exame toxicológico para renovar a carteira de motoristas de transportes de cargas e passageiros, acaba com a multa na condução de crianças sem cadeirinha.

Vale lembrar que, em março, o presidente suspendeu a instalação de novos radares nas rodovias federais. Tornou mais fácil a vida de quem pega o volante sem levar em conta que tem nas mãos uma arma não só capaz de provocar mal a si próprio, mas também a outros condutores ou a pessoas que andam a pé por ruas ou calçadas.

As demais propostas seguem o mesmo norte — dão fôlego a quem costuma atropelar a lei. Os números falam alto. Em 2018, o DPVAT desembolsou indenizações para pagar familiares de 38,2 mil pessoas que perderam a vida no asfalto. Há também as que ficaram com sequelas, muitas das quais incapacitam para o trabalho.

É um baita retrocesso. Não se deve ao acaso o fato de o homem andar para a frente. O movimento implica avanço: deixa para trás o ultrapassado e trilha caminhos novos, enriquecidos com as experiências que cumpriram o seu papel e se tornaram obsoletas. Dão passagem, então, a ideias e projetos capazes de iluminar rumos não experimentados.

O progredir faz parte do processo civilizatório. Quem lhe fecha os olhos condena-se não a ficar parado, mas a regredir. O Brasil, que tem um dos trânsitos mais violentos do mundo, precisa avançar no trato do assunto. Ao lado da punição, a educação. Nunca o alisar a cabeça.

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