É a falta de segurança que gera a violência, e não o contrário

Felipe Sampaio
Ex-assessor de Relações Institucionais do Ministro da Segurança Pública. Ex-diretor geral do Instituto de Estudos de Defesa do Ministério da Defesa. Atualmente é secretário-executivo de Gestão na Secretaria de Segurança Urbana do Recife.

Publicado em: 29/05/2019 03:00 Atualizado em: 29/05/2019 09:03

A Segurança Pública pode ser entendida sob dois aspectos essenciais da humanidade. O primeiro é a segurança enquanto necessidade natural da pessoa. O outro é a segurança como pilar constituidor do Estado. Sem segurança somos humanos incompletos, porque somos privados do nosso direito de Ser e de Ter, sem vivenciarmos nossas humanidades naturais, nem desfrutarmos do resultado do nosso trabalho. Por sua vez, um Estado que não proporciona segurança é um Estado pela metade.

O oposto da segurança é o risco, representado no nosso dia a dia pelo medo. Medo de viver, de ir e vir, de falar, de ter filhos, de conviver, de passear, de trabalhar, de ter seu negócio, de morar, de prosperar. Medo de ser mulher, de ser negro, de ser pobre, de ser rico, de ser idoso, de ser gay, de ter religião. Nesse caso, estamos falando das necessidades humanas a que me referi no início. Sobre o direito à vida e ao bem-estar.

Olhando a Segurança como elemento fundante do Estado, os rudimentos de governo se estabeleceram inicialmente em troca de proteção contra bandidos, saqueadores, vizinhos, inimigos pessoais, animais selvagens e intempéries. Os senhores tribais (e mais tarde os feudais de diferentes modelos) ofereciam segurança ao “seu povo” em troca de vassalagem, tributos, serviço militar e doméstico, favores sexuais e devoção religiosa.

No séc. XIV, a consolidação dos grandes reinos enquanto Estados Nacionais traz consigo a Paz do Rei, reduzindo os conflitos locais, a criminalidade desenfreada e a violência passional, para o bem do “comércio gentil”. A partir do séc. XVIII, a Segurança dá novo salto e a violência diminui mais uma vez com a implementação de políticas relacionadas com o “viver bem”, abrangendo urbanização, mobilidade, estradas, iluminação, praças, escolas, saneamento, saúde, meio ambiente, atividades comerciais e direitos. As políticas de Segurança e Justiça ganham nova feição no séc. XIX com a modernização dos tribunais, a organização de forças policiais e a qualificação da justiça criminal.

Os estudos acerca das causas da falta de segurança sugerem fatores complexos como a pobreza, desigualdade, cultura, história, etnia, desemprego, religião e disputas de território. Normalmente são problemas transversais com soluções de longo prazo, que derrapam na efemeridade das sucessões de governantes.

Da mesma forma, é evidente que a violência é o principal sintoma da falta de segurança. São fenômenos localizados, mapeados e diagnosticados, que podem ser tratados no curto prazo com ações de prevenção, antecipação, inteligência, dissuasão e, se for o caso, repressão e prisão. São aqueles efeitos que se expressam a partir do medo, da frustração e da desconfiança, por meio da criminalidade, do preconceito e demais violações.

Então, a falta de segurança tem uma teia de causas que exige políticas estruturantes de longo prazo, assim como tem efeitos violentos que devem ser tratados no curto prazo. Uma abordagem não funciona dissociada da outra. É preciso que o Estado e a sociedade invistam nos fatores de longo prazo que proporcionam condições de segurança aos ambientes e às relações humanas e que, ao mesmo tempo, os governos, o Judiciário e os legisladores tomem providências efetivas para a inibição das diferentes formas de violência.

Seja olhando pela dimensão humana da segurança, seja quanto ao papel do Estado, é indispensável reconhecer que a segurança decola e a violência despenca toda vez que o Estado se faz presente, como ocorreu nos processos históricos acima, assim como em casos mais recentes, como Nova York, Barcelona, Medelín e Bogotá, Leste Europeu e Pernambuco com o Pacto Pela Vida. O importante é entendermos que a violência não é uma característica natural das pessoas. Ao contrário, são os ambientes sem segurança que propiciam comportamentos violentos. Sociedades que se sentem seguras prosperam em paz.

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