Editorial A comunicação é estratégica

Publicado em: 21/05/2019 03:00 Atualizado em: 21/05/2019 10:39

Os ruídos na comunicação do governo lembram a história do sultão que sonhou ter perdido todos os dentes. Para interpretar a mensagem, convocou o primeiro sábio da corte que, depois de ouvir a narrativa, lamentou a triste sorte do senhor. Ele viveria tanto que enterraria um a um os ascendentes e descendentes e morreria na mais absoluta solidão.

Indignado, o sultão ordenou que o castigassem com 60 chibatadas. E convocou o segundo sábio que, radiante, deu o veredicto. O sultão teria uma vida tão longa que testemunharia as ações dos ascendentes e descendentes transformarem o sultanato em grande potência. Recebeu 60 moedas de ouro como recompensa. Na saída, os dois sábios se encontraram. O primeiro indagou o porquê da diferença de tratamento. Afinal, ambos tinham dito a mesma coisa com palavras diferentes. Qual a explicação? A resposta: “É o jeito de dizer”.

A fábula ensina uma lição: a importância da comunicação empática. Deixa claro que a língua tem o poder de aproximar ou afastar pessoas, de conquistar aliados ou criar adversários, de responder por êxitos ou fracassos. Vale o exemplo do contingenciamento de recursos da educação.

Sucessivos governos têm sido forçados, por reais necessidades, a segurar o repasse de verbas para liberá-las mais adiante. Não o fazem por sadismo ou vingança, mas por imposição da Lei de Responsabilidade Fiscal. Trata-se de procedimento corriqueiro. Ao anunciar o fato, porém, o ministro da Educação deu conotação política ao ato administrativo.

Não só. Afirmou que cortaria recursos de universidades que, sem apresentar o desempenho acadêmico desejável, promoviam “balbúrdia” no câmpus. Em seguida, o MEC divulgou nota esclarecendo a realidade. Mas o estrago estava feito. As manifestações o apresentaram como corte de verbas. Uma operação rotineira como a de contingenciamento, que todas as empresas realizam quando se deparam como dificuldades financeiras, virou um cavalo de batalha.

O presidente Bolsonaro, por sua vez, também demonstrou falta de tato ao comentar o protesto dos jovens. Disse que “a maioria é militante, não tem nada na cabeça”. Por que ignorar o ponto de convergência? Estudantes foram às ruas na luta por mais educação, melhor qualidade de ensino. É esse o objetivo perseguido pelo governo segundo o presidente: que os brasileiros façam bonito no Pisa, que a escola ensine e o aluno aprenda. Por que não dizê-lo de forma positiva?

É importante que o Planalto dê à comunicação o valor estratégico que ela tem. Evitar os desencontros desencadeados pelas fake news e mensagens enviesadas trocadas nas redes sociais. Na era da informação, as palavras oriundas de autoridades ganham alcance e peso. Há que usá-las com o cuidado de quem lida com cristais e a consciência da importância que desempenham na condução dos negócios do Estado. Dar status a irrelevâncias que circulam na internet é igualar-se a elas. Nada mais equivocado.

A gestão de comunicação é importante demais para ser entregue a amadores. Impõe-se o profissionalismo para que o governo estabeleça contato com a população. Sem isso, corre o risco de ficar encastelado no Planalto, impossibilitado de repassar aos cidadãos as ações em andamento e as previstas para recolocar o Brasil nos trilhos do desenvolvimento e da prosperidade.

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