Editorial Brasil na briga de elefantes

Publicado em: 17/05/2019 03:00 Atualizado em: 17/05/2019 08:36

A guerra comercial entre Estados Unidos e China, as duas maiores economias do mundo, tem provocado temor no mercado internacional. A queda de braço de impostos e tarifas entre os dois países, que teve seu primeiro round ainda no início de julho de 2018, se intensificou no mês passado, quando o governo Trump anunciou taxas de 25% sobre gêneros como aço e alumínio. Os chineses reagiram e impuseram sobretaxa idêntica em produtos norte-americanos como soja, carne de porco e veículos elétricos. As hostilidades entre as duas potências afetam em cheio o Brasil.

Ao mesmo tempo em que o país é a segunda maior fonte de aço para os Estados Unidos (responsáveis por um terço das exportações nacionais do produto), a China é nossa principal parceira econômica, importando commodities – em especial a soja, mas também minério de ferro, açúcar, celulose, carne bovina e de frango. Dessa forma, o Brasil acaba ficando em uma posição vulnerável, refém das negociações entre Washington e Pequim. De acordo com os dados oficiais de 2017, as exportações para os americanos movimentaram US$ 26 bilhões — pouco mais da metade do que foi gerado pelas exportações à China.

O “detalhe” é que a soja também é o principal produto agrícola que os EUA mandam para os chineses, correspondente a quase 10% das exportações do Tio Sam. Assim, em um primeiro momento, as novas tarifas tendem a aumentar as vendas do Brasil, incentivando o agronegócio. Mas há o outro lado da moeda: a maior demanda externa pode pressionar os preços locais, o que se configura em um problema, pois o setor agropecuário depende da soja nacional, utilizada como ração.

Além dessa mudança mais visível — a dos preços dos produtos —, o embate entre as potências ameaça com consequências a longo prazo, em função do protecionismo imposto pelos EUA, como a alteração radical nos níveis de produção (para mais ou para menos), possíveis fechamentos ou deslocamento de fábricas e, até mesmo, o aumento da pressão para que o país redirecione produtos para outros destinos.

Torna-se necessário que o governo brasileiro não opte por um “viés ideológico” e foque tão somente na busca por mais negócios e investimentos, abrindo-se para as investidas de ambos os lados. Se Estados Unidos e China não conseguirem chegar a um rápido consenso, há ainda uma terceira via: a procura pela diversificação de parceiros, promovendo alterações nas relações entre as chamadas economias emergentes, as aproximando, em especial com a cooperação entre outros países do Hemisfério Sul.

Sem o desfecho do embate entre as potências, não há dúvidas de que o Brasil sofrerá, afinal, se a economia chinesa desacelerar (e consequentemente o crescimento global também), o preço das commodities que exportamos pode diminuir. Além disso, é muito provável a deterioração geral do cenário, com a fuga ainda maior do investimento estrangeiro, o que poderia enfraquecer o poder do real, aumentando o processo inflacionário.

A Conferência das Nações Unidas sobre Comércio e Desenvolvimento (Unctad) costuma exemplificar a guerra comercial como uma “briga de elefantes”, onde a grama é destruída e todo mundo sai perdendo. Que o Brasil se prepare para não ser pisoteado pelos dois pesos-pesados.

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