Zé Paulo e Fernando Pessoa

Luzilá Gonçalves Ferreira
Doutora em Letras pela Universidade de Paris VII e membro da Academia Pernambucana de Letras

Publicado em: 14/05/2019 03:00 Atualizado em:

A proposta da palestra de José Paulo Cavalcanti Filho, no Curso sobre a Memória, na Apl, era informar o leitor sobre curiosidades acerca do poeta de Mensagem, “dois ou três coisas que você gostaria de saber sobre Fernando Pessoa”, poeta entre os maiores contemporâneos, de Portugal, ao lado de Sophia de Melo Breyner, Miguel Torga. E os alunos do curso foram mais que recompensados. José Paulo, não é apenas um grande conhecedor da obra de Pessoa, mas se tornou um biógrafo obsessivo, e mais que isso, um arquivista, um colecionador de quanto é relativo à vida pessoal, política, intelectual, afetiva, documentos cartoriais,  cartas de amor ou de amizade a amadas e a escritores de seu tempo, objetos de uso cotidiano, que ele busca, descobre, com faro de detetive e, o que é melhor, organiza e apresenta em exposições (várias, já, no Brasil e em outras partes do mundo)  seus achados, repartindo conosco esses tesouros, entregando ao público não apenas o personagem icônico da vida portuguesa, de cidades portuguesas, da cultura portuguesa no século 20, mas também a pessoa do poeta, o indivíduo de carne e osso, que informa e comove o leitor e admirador do poeta. Fotografias antigas, álbuns de família ou de amigos, os óculos de aro, a máquina de escrever, o móvel sobre o qual redigia sua correspondência e seus versos. Fernando Pessoa “par lui-même”, como numa antiga série francesa de biografias de escritores. Didático, José Paulo mostrou a que ponto Pessoa é conhecido. Levou o público ouvinte a completar versos do poeta como O poeta é um fingidor e Sê todo em cada coisa. Põe quanto és no mínimo que fazes. Assim a lua... Apresentou o lado plagiário de Fernando Pessoa, grande leitor de Bocage, de MiIton, que ele retoma em quadras como Abate pois este orgulho  ou no poema  Il penseroso, sobre a freira de “estola negra de crepe muito fino envolvendo ombros e decote.” Em vários de seus heterônimos, Pessoa é plagiário de si mesmo, como quando fala, com humor, em nome de um certo Joaquim Moura Costa, que é ele próprio: “Copiaste? Fizeste bem. Copia mais, sem canseiras. Copia. Pilha. Retém. É a única maneira de não escreveres asneiras.” Entre outros traços biográficos, José Paulo comentou a grande admiração de Pessoa pelo poeta Rimbaud, autor de Illuminations, que aos 16 anos abandonou a poesia, tornou-se negociante de escravos longe da Europa, e que, muito doente, pensou voltar à França para rever a irmã Isabelle e faleceu em Marselha, antes de chegar à casa materna. Pessoa refez a trajetória de Rimbaud, mas para nossa alegria, continuou a escrever versos. Por essa paixão pessoana, e a literatura resultante, José Paulo Cavalcanti Filho foi agraciado com importantes prêmios nacionais e internacionais, entre os quais o Jabuti, o Prêmio José Ermirio de Moraes da ABL. Entre outras suas publicações relativas ao poeta português, está o CD de poesias de Pessoa, lidas ao lado de Maria Lecticia, sua esposa, um regalo. Gravações de poesia popular, ao lado de cantadores, e pelo menos dois livros de contos e crônicas dedicados a amigos (Aos amigos tudo) ou sobre o cotidiano de sua atividade como advogado, Só mente a verdade. Por enquanto.

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