Serão deuses?

José Luiz Delgado
Professor de Direito da UFPE

Publicado em: 01/05/2019 03:00 Atualizado em: 01/05/2019 09:14

Não podem ser investigados os juízes? Não se pode constituir uma CPI da Toga? Não se pode submeter um ministro do STF a um processo de impeachment? Não se pode criticar o Supremo ou alguns de seus ministros? Então, são deuses? Como dizia o humor de Jo Soares, sois rei? São inatacáveis? Estão acima de quaisquer suspeitas? São incorruptíveis? Ah, se fossem...

Há que investigar, sim, abertamente a situação financeira de cada juiz no Brasil: sua declaração de renda, seu patrimônio, para ver a compatibilidade entre uma coisa e outra. Por que não? Isso deveria ser objetivo fundamental, e atividade permanente, do Conselho Nacional de Justiça. Para assegurar a lisura da função jurisdicional, a transparência, a integridade do Judiciário.

O jurisdicionado tem absoluto interesse em saber se seu litígio está submetido a juiz isento e honesto, ou se está nas mãos de juiz que vende as sentenças. De fato tem integral direito a isso, precisa dessa certeza.

Esse também deveria ser interesse dos bons juízes – que ainda os há, e muitos (felizmente): o de não serem confundidos com os maus juízes, venais, corrompidos,  que também os pode haver (infelizmente). Deveriam os bons juízes ser os primeiros a clamar por essa investigação financeira rigorosa e cotidiana, abarcando todos, absolutamente todos, os magistrados. Os que nada têm a temer deveriam exigir esse exame, para evitar que os vendilhões continuem a se esconder atrás deles.

A declaração, feita alguns anos atrás,  daquele desembargador federal que libertou Temer  – de que a propina que administradores públicos recebiam pode ser mera “gorjeta”, como a que se dá a um garçon (como se o homem público pudesse receber “gorjetas”!)  –,  permite a dúvida de saber se também ele andou, inclusive neste caso, recebendo “gorjetas”, que pretende morais e lícitas.

A respeitada ministra Eliana Calmon denunciou que advogados instruem clientes delatores para não delatarem nada a respeito de juízes. Porque temem ser retaliados por eles (e por colegas, dado o corporativismo). Será verdade  isso?

E o CNJ não faz nada? Então, precisa ser integralmente revisto. Porque não está cumprindo seu papel essencial, o de fiscalizar a magistratura.

Exprimir dúvidas como essas, discordar de certas posições de magistrados, formular  críticas (procedentes ou improcedentes, razoáveis ou excessivas, são outras questões, apuráveis até em processo próprio de danos morais), é agora inconstitucional? São deuses e não podem ser criticados? Por isso ou por aquilo (por excesso de exposição, pela vaidade de aparecer nas televisões, pela vulgarização de suas condutas, pelo fenômeno das redes sociais, que deu voz não aos imbecis mas a todos os cidadãos), o fato é que o Supremo está-se enredando num processo de desprestígio social como nunca se vira anteriormente. Conhecido somente de longe e tendo integrantes muito mais austeros, o Supremo de antigamente gozava de uma respeitabilidade de que o atual nem faz ideia. O Supremo está obviamente em crise.

(Ainda posso dizer isso? Ou corro o risco de ser alvo de outro inquérito promovido pelo próprio órgão julgador?)

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