Bráulio Bessa: poesia e tecnologia

Luzilá Gonçalves Ferreira
Doutora em Letras pela Universidade de Paris VII e membro da Academia Pernambucana de Letras

Publicado em: 30/04/2019 03:00 Atualizado em:

Semana passada mais um Festival de Literatura aconteceu na cidade, homenageando dois personagens marcantes em nossa vida  cultural, ligados de algum modo à  presença lusófana entre nós. Em parceria com a Academia Pernambucana de Letras, sob a coordenação simpática e segura de Carmem Peixoto, o Riomar festejou e nos fez conhecer de mais perto, dois membros da APL que, por muitos anos tornaram mais estreitos os laços que nos unem a Portugal. José Paulo Cavalcanti Filho, grande especialista da obra do poeta Fernando Pessoa, e Margarida Cantarelli, que durante anos presidiu a associação de amigos do Porto, tem pronunciado conferências sobre literatura brasileira em universidades lusas e que ultimamente está à frente da criação da Casa de Pernambuco, em colaboração com instituições culturais portuguesas, visando uma maior difusão de nossa literatura na terra de Camões. Um sucesso, este Festival, que, por sete anos ofereceu ao Recife, encontros de literatura e palestras diversas sobre intelectuais brasileiros, pernambucanos sobretudo, como Gilvan Lemos, João Cabral de Melo Neto, Hermilo Borba Filho, Raimundo Carrero, entre outros. E ofereceu ao público apresentações de artistas nordestinos, como o Grupo Os dispersos, como Claudio Almeida, Jessier Quirino, Santanna, Petrucio Amorim e Bráulio Bessa. Bráulio Bessa é uma revelação de poeta. Nascido em pequena cidade cearense, cedo mostrou a garra e o talento de quem, conforme Euclides da Cunha, é antes de tudo um forte. Herdeiro de Patativa do Assaré, leitor de Nelson Rodrigues (“todo homem é vira-lata” escreve), de Kipling (“e se cair, jamais pare, se levante, se refaça”), admirador de Milton Nascimento, de Lirinha do Cordel do Fogo Encantado, sonhando em ultrapassar as barreiras preconceituosas que grande parte dos brasileiros coloca sob a palavra nordestino, Bráulio descobriu um dia, a internet: “Fiquei encantado. Então eu crio uma conta, com meu nome? No B vai ter Bráulio Bessa? Eu posso publicar meus poemas e qualquer pessoa no mundo pode ler? Era como mágica”. Lembra a figura do poeta nordestino recitando nas feiras para que as pessoas possam consumir sua arte.. E enxerga na internet “a maior feira do mundo, que não fecha hora nenhuma, tem todo tipo de gente, não tem fronteira...” Largou a faculdade no último semestre, criou a página Nação Nordestina (250 mil seguidores, de início, e logo um milhão), passou um tempo vivendo de consertar computadores; Até que uma grande emissora de televisão o descobriu, a partir de matéria em jornal da capital cearense. E o Brasil conheceu Bráulio, que escreve poesia como quem respira, seu talento, sua esperança, sua fala afetuosa. Sem perder a lucidez e o espírito crítico ante o poder da tecnologia que “mudou até a rotina/ de quem tá se alimentando. Se a comida for chique, vai logo fotografando. Porém repare, meu povo: quando é feijão com ovo não vejo ninguém postando”. Bráulio Bessa publicou vários livros, sob forma impressa. Em Poesia que transforma (Editora Sextante, 2018, com ótimas ilustrações de Elano Passos) ele dá conselhos ao leitor: “Seja bom, justo e honesto, não faça mal a ninguém. Seja anônimo ou famoso, seja e pratique o bem, pra ser fã de você mesmo e ser ídolo de alguém”. E conclui: “Há quem viva nesta vida poupando tudo o que tem, se preocupando em deixar carro, casa ou outro bem. Mas lhe digo uma verdade: bom mesmo é deixar saudade no coração de alguém”.

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