"Solidariedade seletiva" - Notre-Dame, Moçambique

Francisco de Queiroz B. Cavalcanti
Professor titular e diretor da Faculdade de Direito da UFPE

Publicado em: 19/04/2019 03:00 Atualizado em:

Há não muitos dias a imprensa noticiava: “Passou de mil o número de mortos pelo ciclone Idai, que devastou Moçambique, Zimbábue e Malaui há quase um mês. As autoridades locais registraram os seguintes balanços de vítimas nesta quarta-feira (10): Moçambique: 602 mortos; Zimbábue: 344 mortos; Malaui: 59 mortos. Segundo a agência Associated Press, o número de vítimas deve aumentar. Inclusive, talvez nunca se chegue a um total de mortos definitivo. Isso porque ainda há um número desconhecido de desaparecidos, e ainda existe o risco relacionado às doenças decorrentes dos alagamentos causados pelo ciclone Idai”. (g1.globo.com). Destaque-se: “ Pedro Matos, do Programa Alimentar Mundial (PAM), entrevistado pela enviada especial da RFI ao país africano, sublinha que “a ajuda humanitária é insuficiente”... (http://br.rfi.fr/africa/20190324-ajuda-humanitaria-) Até hoje pessoas sofrem com milhares de habitações destruídas, fome, doenças... Noticiou-se ajuda humanitária semelhante a esmola: “A Alemanha anunciou uma ajuda no valor de um milhão de euros a Moçambique e os Estados Unidos vão enviar 200 mil dólares para ajudar as populações moçambicanas afetadas pelo ciclone Idai. Estes donativos juntam-se aos 4,3 milhões já disponibilizados para ajuda humanitária na África Austral, num comunicado da embaixada em Maputo.” (https://tvi24.iol.pt/internacional/). Já por outro lado, há dois dias as grandes redes de mídia noticiam a lamentável ocorrência com a Notre-Dame, em Paris e a sensibilidade de titulares de grandes fortunas, tristes com a ocorrência, dispondo-se a fazer doações centenas de vezes maior que o ôbulo para a áfrica, para a reconstrução do templo. Noticia-se “The billionaires behind luxury giants LVMH Group, Kering and L’Oreal on Tuesday pledged a combined €500 million ( million) after a massive fire ripped through the Paris cathedral. LVMH (LVMHF) and its CEO Bernard Arnault have promised €200 million ( million). The donation has been matched by the Bettencourt Meyers family, which controls L’Oreal (LRLCF). The Pinault family, which operates luxury conglomerate Kering (PPRUF), has pledged €100 million ( million)...Combined with other donations from companies including French bank Crédit Agricole, the total amount pledged by business and wealthy donors has reached million.” Não só franceses, mas americanos, alemães, europeus em geral, se sensibilizaram com a “inestimável perda”. Sem dúvida a “NotreDame” representa uma bela peça arquitetônica, um exemplo da opulência francesa e um atrativo turístico. Mas, sem comparação com a fome e a miséria na esquecida Moçambique. Mais lamentável que os dois fatos é a constatação da mesquinhez humana. Aqueles povos europeus que tanto exploraram a África e tantos que “choram” pelas pedras, cal e madeira da bela Notre Dame, não lembraram dos pobres e desvalidos abaixo da linha do Equador. A comparação faz lembrar o simbolismo do nascimento de Cristo em uma simples manjedoura. 

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