Sinais trocados

Maurício Rands
Advogado formado pela FDR da UFPE, PhD pela Universidade Oxford

Publicado em: 01/04/2019 03:00 Atualizado em: 01/04/2019 08:50

O alvo de ambos é o ‘establishment’. Culpam a mídia. Atacam a política. Investem contra o Congresso Nacional, instituição cuja complexidade e essencialidade para a democracia os dois parecem não compreender. E onde nunca aprenderam a transitar. Demonizam os adversários. Para eles, a culpa é sempre dos outros. Desde a Presidência da República brigam com a Presidência da Câmara dos Deputados. Atribuem qualquer crítica a uma ‘conspiração contra os verdadeiros interesses do povo’. Pretendem governar ‘diretamente com o povo’. Os dois foram eleitos em meio a fortes esperanças dos deserdados que penam nas filas do desemprego, nos insalubres bairros da periferia e nos péssimos serviços públicos. Uma frustrou esperanças ao causar a maior recessão de nossa história através de sua desastrada política econômica pretensiosamente intitulada ‘nova matriz econômica’. Que nos deixou um legado de 14 milhões de desempregados. O outro já começa a derreter as expectativas despertadas com a sua eleição. Que a sua popularidade em queda nesses primeiros 90 dias de governo já alienou um terço dos que o apoiavam, sobretudo nas camadas populares. Populismo em ambas as variantes. Quando atacados, concentram-se na comunicação direta com o povo. Em reuniões diretas com apoiadores, num caso. Ou através do twitter, no outro. Em mais uma coincidência, esta acidental, ambos são notórios pela dificuldade de raciocínio e expressão. De comum, também a atração por regimes autoritários. Pelos de ‘esquerda’, como as ditaduras de Maduro e Ortega, no caso da primeira. Pelos de ‘direita’, no do segundo. Que acaba de comemorar a ditadura militar brasileira de 1964 e elogiar a de Pinochet. E que se identifica com Donald Trump, Viktor Orbán e Benjamin Netanyahu. Em política externa, investem contra princípios e procedimentos de comprovado êxito. Que foram amadurecidos pela reconhecida excelência do Itamaraty. Como foi a desastrada ingerência no assunto Irã, com a concordância da primeira. E o envolvimento na questão Israel-Palestina, com prejuízos para nossas exportações aos países árabes, iniciativa do segundo. Do alto de sua frágil formação intelectual, os dois comungam de instintos similares quando o assunto é corporativismo, estatismo e nacionalismo. No combate à corrupção, parecem duros quando os deslizes são cometidos por adversários. Mas lenientes, para dizer o mínimo, quando os autores estão ligados aos próximos ou correligionários. Como verificou-se na rede de corrupção na Petrobrás e outras estatais montada pelos principais líderes do seu partido e de seu governo, no caso da primeira. Inclusive com a compra superfaturada de Pasadena, por ela autorizada na condição de presidente do conselho de administração da estatal. E como ocorreu com o segundo nos laranjais das campanhas de seu partido, nos desvios de verbas dos gabinetes de seus filhos, inclusive com cheque dado por assessor à 1ª dama. Além da amizade daqueles com milicianos. De comum, a larga complacência com malfeitos, desde que sejam dos próximos. Esses defeitos somam-se à incapacidade de reformar as instituições políticas. E, portanto, são potencializados porque o presidencialismo brasileiro e a imensa burocracia do estado tornaram-se disfuncionais a qualquer projeto duradouro de desenvolvimento do país. E nisso eles também se assemelham. Os personagens Dilma e Jair representam campos políticos de improvável identificação. Mas será mesmo que o populismo de esquerda de uma e o populismo de direita do outro nada têm em comum?

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