Projeto Novo Recife

Alexandre Rands
Economista, PhD pela Universidade de Illinois e presidente do Diario de Pernambuco

Publicado em: 30/03/2019 03:00 Atualizado em: 31/03/2019 17:01

O avanço do poder político da direita no país tornou-se óbvia com a vitória de Bolsonaro na última eleição presidencial. Apesar de conquistar os votos, a direita ainda não capturou as preferências políticas do povo brasileiro, que ainda está sob a hegemonia ideológica da esquerda. Igualdade, democracia e eficiência econômica são as prioridades da verdadeira esquerda e que ainda estão no coração das prioridades de nossa população. Por isso o atual governo não consegue conduzir o país de forma organizada. Aí aparecem as lambanças desmoralizadoras que têm sido feitas no governo no seu primeiro trimestre à frente do poder. Surgem ao se concentrar em detalhes que reproduzem os verdadeiros problemas e prioridades do país. Os atropelos na educação e as declarações da ministra Damares são bons exemplos do total despreparo e incapacidade do governo conduzir o país com essa contradição entre o poder político e a hegemonia ideológica. Os conflitos na condução da reforma da Previdência são sem dúvida a maior demonstração da dificuldade encontrada. A proposta de recomposição da remuneração dos militares na reforma para esse segmento foi o maior exemplo da incapacidade do governo de governar com tal contradição. Pode com tal ideia ter matado a aprovação da reforma da Previdência, que apesar dos seus exageros no que diz respeito às mudanças no Benefício de Prestação Continuada, ainda assim promoveria a igualdade no país.

No Recife uma direita enrustida, que tenta se apresentar diante da sociedade como de esquerda, também resolveu vir à luz com o objetivo de barrar um projeto importante de redefinição do espaço urbano, que é o projeto Novo Recife. Essa direita tenta inviabilizar a construção das torres que mudarão a cara de nossa cidade nos próximos anos. Ela traz na sua postura a marca de uma direita que se infiltrou na esquerda nas últimas décadas e tenta perpetuar a pobreza, condenando nosso povo à miséria, ao se empenhar para barrar aquilo que Marx chamou de desenvolvimento das forças produtivas. Nesse caso, a sua defesa do atraso está ligada à proteção e ao incentivo à criação de favelas contra as leis de mercado na ocupação urbana.

Com sua postura, essa direita efetivamente defende que se eleve o custo de vida na cidade para se obter um mesmo nível de bem-estar, por não haver ocupação eficiente dos espaços urbanos. Se não se ocupar o Cais José Estelita com imóveis, os apartamentos em Boa Viagem e outros bairros próximos vão ficar mais caros e uma classe média emergente de segmentos desfavorecidos vai ter que se deslocar para mais longe, provavelmente Candeias ou mesmo o Barro e outros bairros mais afastados. Isso encarece o transporte, aumenta a poluição e eleva o tempo gasto em locomoção, reduzindo o tempo dedicado ao trabalho e ao lazer. A consequência é que ascender socialmente da classe D para a C no Recife se tornará mais difícil e com menos benefícios em qualidade de vida. Assim, as pessoas se esforçarão menos para conseguir tal ascensão. O resultado será mais concentração de renda, além de renda per capita mais baixa. Ou seja, os ideais da esquerda (igualdade e eficiência econômica) estarão ainda mais longes em nossa cidade. Por isso, que o Ocupe Estelita é na verdade um movimento de direita, apesar de se apresentar como de esquerda. Vale observar que o fato dele tentar fazer isso desmoralizando as instituições abala também o terceiro pilar do pensamento de esquerda, que é a defesa da democracia e respeito às instituições.

Vale lembrar também que ao criar conflito esse movimento de direita também eleva os custos de construção e aumenta a quantidade de recursos utilizados para se obter um mesmo resultado, que é a construção de um determinado número de moradias e escritórios. Isso faz com que o Recife se torne uma cidade mais cara e que por tal seja menos competitiva. O resultado é que se arrecadará menos impostos, se ofertará menos educação e saúde para a população, e se reduzirá a renda média da sociedade como um todo.

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