Recife, a noiva da Revolução

Geraldo Julio
Prefeito do Recife

Publicado em: 30/03/2019 03:00 Atualizado em: 31/03/2019 17:01

Cidade insurreta, Recife, a capital do Nordeste e da criatividade, jamais se curvou às discordâncias ideológicas de natureza político-econômica. Abrigo de nomes inspiradores como Frei Caneca, Leão Coroado, Gregório Bezerra, Dom Helder Camara e Miguel Arraes, entre muitos outros, a cidade, seu povo e seus pensadores sempre se manifestaram a favor da liberdade e de um mundo mais justo para todos.

Causa, portanto, estranhamento e surpresa à cidade natal de Paulo Freire a notícia de que há o que se celebrar em relação aos acontecimentos que envolveram o Brasil em uma sombria penumbra entre os anos de 1964 e 1985. Não há o que se comemorar. Há sim, o que não esquecer, pois um povo que desconhece o seu passado é incapaz de construir um futuro melhor para a coletividade. Sendo assim, vamos rememorar.

O golpe foi instaurado no dia 31 de março de 1964. O que parecia uma mentira se tornou um pesadelo cuja bandeira defendia o uso da força para coibir uma suposta ameaça vinda de teorias alinhadas aos discursos de esquerda. Sim, foi golpe. A destituição de João Goulart, presidente legitimamente e democraticamente eleito, foi só o primeiro dos pequenos e grandes golpes que se estenderiam por duas décadas. Direitos políticos cassados, silenciamento e sumiço de pessoas cujas discordâncias ideológicas causavam estranhamento aos militares no exercício do poder, supressão de eleições, auto-exílio ou diásporas forçadas aos filhos da pátria que lutavam pela liberdade de seus pares.

No Recife não foi diferente. À frente do Palácio do Campo das Princesas, Miguel Arraes recusou-se a deixar o prédio mediante coação dos militares do Exército para não trair os eleitores que haviam depositado nele suas esperanças traduzidas em votos. Preso, deposto e encarcerado por mais de um ano, exilou-se na Argélia e só pôde abraçar os seus mais de uma década após a instauração das atrozes injustiças impostas ao povo de seu torrão natal.

Recife foi palco de revoluções. Estas sim, nós as celebramos. Celebramos o dia 6 de março para nos lembrarmos da Revolução Pernambucana de 1817. Rememoramos a Insurreição Pernambucana, quando negros, índios e brasileiros lutaram lado a lado para pôr fim à ocupação dos holandeses no Século XVII. Relembramos a Guerra dos Mascates, a Confederação do Equador e a Revolução Praieira. Brindamos e saudamos a memória de todos aqueles que conspiraram a favor dos ideais de liberdade e justiça em todos esses movimentos. A esses, a cuja memória devemos honrar, devotamos nosso desejo de sermos uma cidade cada vez mais justa e com melhores oportunidades para todos. Por estas pessoas, Recife sempre será aquela cidade descrita pelo poeta Carlos Pena Filho, como a Noiva da Revolução.

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