Retirantes nordestinos, uma triste realidade

Giovanni Mastroianni
Advogado, administrador e jornalista

Publicado em: 29/03/2019 03:00 Atualizado em: 29/03/2019 09:31

Apaixonado, como sempre fui, pelo folclore nordestino, não poderia, depois de abordar, em artigos anteriores, bacamarteiros, rendeiras, ceramistas, repentistas, cordelistas, bandas de pífano e até ex-votos, deixar de incluir nesse rol folclórico os sofridos  retirantes, que são aquelas pessoas que emigram das regiões Norte e Nordeste, fugindo da seca  Mas, não é somente a seca a única responsável pelo êxodo, principalmente rural. Também, a falta de emprego e a ausência de uma outra modalidade de sobrevivência forçam a retirada de famílias inteiras do lugar de origem, em que vivem, na esperança de encontrarem um ambiente mais humano, em outras plagas do país, principalmente no Sudeste, mais bafejado pela sorte, com múltiplas riquezas e livre de sucessivos castigos da natureza.

É a falta de água a grande vilã dos moradores do semiárido nordestino, onde as chuvas são escassas, acarretando sede, fome, miséria, doenças e a recorrente fuga para outros territórios.

Foi a partir do século 18 que os cognominados sertanejos habitaram o conhecido “polígono das secas”, enfrentando, assim, os severos efeitos da ausência de chuvas.

Coube ao jornalista, escritor e professor Euclides da Cunha historiar os sertões, exaltando os costumes dos vaqueiros, descrevendo o estouro da boiada, abordando as famigeradas secas e suas consequências, bem como as divergentes religiosidades do povo sertanejo. É dele a célebre frase: “O sertanejo á antes de tudo um forte”. Qual a explicação para tão famosa expressão? Uma das justificativas: “Porque reage aos rigorosos sofrimentos em que habita e por se sujeitar à solidão.”

Um dos períodos de maior privação do sertanejo ocorreu nos idos de 1877, quando da chamada “Grande Seca”, que, segundo registros dos historiadores, lamentavelmente, exterminou grande parte da população cearense, causando muita tristeza em todo o país.

Os retirantes serviram de inspiração para o saudoso mestre Vitalino, a quem visitei, em reportagem jornalística, na sua modestíssima casinha, no Alto do Moura, distrito de Caruaru. Foi com esse famosíssimo ceramista que adquiri, manipulado em barro, uma de suas mais elogiadas criações: os retirantes, encomenda que recebi do então dirigente nacional do Loide Aéreo, em troca de uma passagem de avião Rio-Recife, solução encontrada para viagem de férias, ao término do curso de ciências jurídicas e sociais. Infelizmente, apesar de todo cuidado com a embalagem, na viagem de volta, um passageiro da aeronave, involuntariamente, chutou a cabeça de um dos retirantes, decepando-a. Com habilidade, consegui colar a parte superior da peça, detalhe que não foi percebido pelo solicitante, que considerou a peça uma lembrança inestimável.

Os comentários abaixo não representam a opinião do jornal Diario de Pernambuco; a responsabilidade é do autor da mensagem.