Viagem, escrita e vida

Patricia Gonçalves Tenório
Escritora, doutora em Escrita Criativa (PUCRS, 2018). Ministra o Curso de Extensão da Unicap Estudos em Escrita Criativa

Publicado em: 29/03/2019 03:00 Atualizado em: 29/03/2019 09:32

Fernando Pessoa afirma que não é preciso sair da própria aldeia para conhecer o mundo. Concordo em parte com o autor do Livro do desassossego. Ao viajarmos nos pomos em movimento, saímos do centro, desbloqueamos os sentidos, ampliamos a visão, o olfato, a audição, o paladar, o tato. E nos abrimos para a necessidade de criar.

Um trem que parte em dois minutos da cidade do Porto. A língua que não conhecemos e utilizamos mímicas para nos comunicar em Praga. A surpresa de uma paisagem inesperada nas Minas Gerais. A neve fria caindo em nosso rosto pela primeira vez em Bariloche. O sabor do açafrão em nossas papilas gustativas na cidade de Istambul.

Mas também descobrimos nos grandes livros o fazer criativo dos escritores, suas viagens interiores em busca de si mesmos, sem precisarmos sair da nossa aldeia, do nosso próprio lugar.

A ausência de vírgulas na poesia de Sophia de Melo Breyner. Os travessões no final de versos de Emily Dickinson. A intenção, o tom e o efeito de Edgar Allan Poe. O esvaziamento de si ensinado por John Keats e encontrado em Bernardo Soares, o semi-heterônimo de Pessoa.

Basta procurarmos bem e encontraremos as técnicas dos poetas e ficcionistas sem precisarmos sair da nossa casa, nas páginas de seus livros, nas palavras que nos guiam em busca do próprio caminho, da própria voz. O nosso lugar no mundo e na vida.

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