Collor, lições do futuro

Luiz Otavio Cavalcanti
Ex-secretário da Fazenda e ex-secretário de Planejamento de Pernambuco.

Publicado em: 09/03/2019 03:00 Atualizado em: 09/03/2019 20:24

Presidentes da República brasileiros têm sido flexíveis, conciliadores, otimistas, pragmáticos e ambivalentes.

Brasileiramente ambivalente, como Getúlio. Brasileiramente otimista, como Juscelino. Politicamente ambíguo, como Fernando Henrique Cardoso. Brasileiramente pragmático, como Lula.

Dois ex-presidentes afastaram-se desse modelo. Com traços pessoais próprios. Não exibiram características culturalmente brasileiras de conciliação, republicanismo, flexibilidade e otimismo.

Foram eles: Jânio Quadros e Fernando Collor.

Collor foi produto da era Sarney. Esta se caracterizou pelo convencionalismo político. No governo Sarney, tudo foi convencional: forma de administrar, modo de fazer política, maneira de ver negócios. Só não foi convencional a taxa mensal de inflação: até 40%, ao mês.

O eleitor raciocinou: se governo convencional produz inflação de 40%, ao mês, a solução é eleger um presidente não convencional. E votou em Collor.

Collor alcançou a Presidência sem suporte partidário importante. Sua candidatura foi lançada por partido sem tradição e sem expressão parlamentar: o Partido de Representação Nacional – PRN.

A falta de organicidade de sua sustentação partidária serviu para tornar ainda mais nítida a figura real do presidente: arbitrário, inflexível. Nesse contexto, passou a usar, cada vez mais intensamente, o populismo. Invadiu a televisão com voos supersônicos em caças a jato e caminhadas apolíneas para acentuar vigor físico.

Seu governo, a partir do segundo ano, apresentava fragilidade econômica e defeito moral. A inflação não baixava. E a corrupção aumentava. O presidente foi atingido por dois movimentos: um movimento de dentro para fora do governo, na ineficiente gestão econômica. E um movimento de fora para dentro do governo, nas limitações políticas do governo.

A solidão política esmaeceu a figura hercúlea de Collor na metade do mandato. Solidão feita de silêncios políticos. Populismo alimentado pela inaptidão republicana. Retrato em preto e branco de gestual antes colorido, murro que socava o ar. Inconsequência tocando o vazio. Chegou a um beco sem saída. Economia estagnada. Política colapsada.

Resultado: impeachment. Um cenário pouco brasileiro, de líder que dispensou traços culturais do homem tropical, dialogal e cordato.

Jânio e Collor tinham três pontos em comum: eram ambos introspectivos, populistas e céticos. Não cultivavam as instituições republicanas. E não estimulavam a seiva do otimismo. Trabalhavam impossibilidades. E não, viabilidades. Por isso, presidentes possíveis e inviáveis.

Jânio cultivou o poder no voto. Fingiu desprezar o poder para ampliá-lo. Collor manipulou o poder. E do poder foi sendo afastado inevitavelmente. Jânio afastou-se para aproximar-se do poder. Collor aproximou-se e foi afastado.

Ambos, por caminhos diversos, deixaram a trilha do poder. E, pela mesma falta de vocação cultural, perderam o senso do Brasil.

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