Céu grego

Luiz Otavio Cavalcanti
Ex-secretário da Fazenda e ex-secretário de Planejamento de Pernambuco.

Publicado em: 19/02/2019 03:00 Atualizado em: 19/02/2019 08:26

Nesta véspera do entrudo, apesar de tudo, o céu está azul.

A base do Estado ateniense era o mito. Dourado na retórica dos discursos pronunciados na Ágora. Esta, era elemento essencial na constituição do espaço público da democracia direta de Atenas.

A base da tragédia de Ésquilo, o mais fino autor ateniense, é a família. Por uma razão simples: a família se opõe ao Estado. É assim na peça Agamenon, na qual a lei da vingança insuperável leva à loucura. É assim em Oréstia, na qual os juízes do aerópago vencem os novos deuses da cidade. É o antigo derrotando o novo.

Como se fossem camadas de uma mesma e mediterrânea República, a ordem familiar se justapõe à ordem pública. Ou se contrapõe?

A família, desde o jus civile, é coisa privada. O Estado, desde Cesar, é res publica. A família se reúne privadamente na mesa dominical. O Estado se apresenta no púlpito ordinário de tarefas transparentes. Na família, o comando é reconhecido no conselho particular. No Estado, o processo decisório passa pela fórmula Montesquiana, tripartite. Na família, prevalece a paixão. No Estado, busca-se a razão. Mesmo com tal desrazão.

Naturezas diversas, critérios diferentes. Na mistura, resultados contraditórios.

Evidente que a cidade evolui. Transforma-se em polis. Democratiza-se. Chegam novos grupos sociais. Novo pensar. Novos costumes. Mas, as mesmas cores: vermelho e azul. O novo é o moderno?

Na tragédia grega, não faltam personagens femininas: Fedra, Electra, Medéia. Fedra entrega-se a Hipólito, suicida-se e impõe ao marido, Teseu, a condenação de Hipólito. Electra leva Orestes, seu irmão, a matar a mãe. Medéia é o símbolo da passionalidade crudelíssima. Encerra o trágico em terras e mares vários.

Mas todas elas deixam lições valiosas dos desígnios humanos na pedagogia democrática.

Em regiões próximas ao trópico, escasseiam figuras femininas. O macho reina sozinho. Falta a sensibilidade feminina para atenuar o patriarcalismo. Subtrai-se a intuição feminina que inspira antecipações. Elimina-se a fragilidade feminina que amplia a taxa de concórdia.

No pós-entrudo, apesar de tudo, torçamos para o céu continuar azul.

Os comentários abaixo não representam a opinião do jornal Diario de Pernambuco; a responsabilidade é do autor da mensagem.