A qualidade da democracia

Plutarco Almeida
Sacerdote jesuíta e jornalista

Publicado em: 26/01/2019 03:00 Atualizado em: 28/01/2019 08:45

Nesses tempos bicudos em que vivemos, muito se tem falado em democracia. Todo mundo quer viver na democracia e o medo de perdê-la é algo que sempre nos incomoda. Discussões intermináveis (e chatas também) acontecem, sobretudo, no meio intelectual. Tem gente, aliás, que acha que a democracia está morrendo, face aos constantes ataques de determinados grupos de interesse. Assim, modelos autoritários de poder correm o risco de serem implantados desfazendo toda esperança democrática que porventura possa ainda existir entre nós. Ano passado, houve até quem visse no horizonte do Brasil as nuvens carregadas de um tsunami fascista chegando através das urnas eleitorais. A vitória da direita assustou realmente. Porém, a previsão não se confirmou e é muito pouco provável que venha a ser confirmada, ao menos por enquanto.

O diabo não é tão feio quanto se pinta. Cá com meus botões, não creio que a democracia esteja morrendo ou que ela vá morrer um dia. Eu e você morreremos bem antes! Enquanto os interesses econômico-financeiros do grande capital mundial estiverem à salvo, a democracia também estará. Ditaduras não interessam mais ao mercado, muito pelo contrário, só atrapalham. Os aglomerados políticos de plantão nos governos seguirão, como sempre seguiram, é bom que se diga, as regras ditadas pelo capital. Quanto a isso não há porque a gente se iludir. As discussões acadêmicas podem ser muito interessantes, mas como dizia minha avó, “na prática a teoria é outra”.

Se a democracia, a meu ver, não está à beira da morte, entretanto ela pode ser ultrajada todos os dias. Então não se trata de falar de morte, mas sim da qualidade da democracia que temos no país hoje. Desconfio seriamente que este é um dos nossos grandes desafios. E aqui, por favor, não vamos apontar o dedo apenas para os governantes. Isso diz respeito a todos nós! A responsabilidade tem que ser dividida. Trata-se mais de uma questão de cidadania, ou seja, de respeito à liberdade de todas as pessoas. Democracia rima com liberdade, respeito e cidadania. Quando, por exemplo, eu jogo lixo nas ruas, estaciono meu carro em local proibido, ocupo o lugar de um deficiente físico ou pessoa idosa no ônibus ou cometo qualquer tipo de fraude contra os bens públicos, não posso jogar a culpa no governo, seja de direita ou de esquerda. A qualidade da democracia depende de atitudes individuais e coletivas, não apenas de belos discursos ou acaloradas discussões.

Enquanto as pessoas no Brasil continuarem a desrespeitar os seus semelhantes e a viverem apenas em função dos seus interesses egoístas, não atingiremos o status de uma verdadeira cidadania e a qualidade democrática estará sempre prejudicada. Poderemos ter o melhor governo do mundo, o melhor carnaval, as melhores praias, as mais sofisticadas tecnologias, no entanto continuaremos sendo o mesmo país tupiniquim atrasado de sempre.  A não ser que alguém me prove o contrário, penso que existe somente um jeito de sairmos desta situação e chegarmos a adquirir uma qualidade democrática superior: a educação. Então, senhores e senhoras, respeitável público: menos armas e mais livros! Menos cadeias e mais escolas!

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