O Brasil em 2019: entre o diagnóstico e a implementação

Felipe Tâmega
Economista-chefe da Itaú Asset Management

Publicado em: 18/01/2019 03:00 Atualizado em: 18/01/2019 08:36

Ao iniciarmos um novo ano é natural que surjam questionamentos sobre o que podemos esperar nos meses que estão por vir. Fazer previsões é sempre uma tarefa ingrata, ainda mais num momento de transição política e econômica sob um cenário externo desafiador. Vejamos então primeiro o que o cenário doméstico parece nos reservar.

Ainda é muito cedo para se avaliar o próximo governo. Porém, as indicações de política econômica até o momento parecem animadoras. O novo governo vem se comprometendo com uma política monetária ortodoxa conduzida por um banco central autônomo, com uma ampla agenda de privatização e com uma rápida consolidação fiscal.

Em relação ao primeiro tema, a autonomia do Banco Central, sinalizações importantes foram dadas recentemente. Com o apoio do presidente eleito Jair Bolsonaro, a tramitação de um projeto de autonomia que estava parado na Câmara dos Deputados parece ter ganhado novo ímpeto, sugerindo que o mesmo possa ser aprovado no início do ano. Esse projeto será importante para diminuir possíveis pressões políticas.

No quesito privatizações, as indicações são de que as principais empresas estatais não serão postas à venda, mas que mesmo elas poderiam ter parte de seus ativos alienados, gerando não só receitas relevantes no curto prazo, como também induzindo novos investimentos pelas empresas que comprarem tais ativos e permitindo que a administração federal tenha maior foco.

Dessa maneira, a agenda de privatização teria não só um efeito fiscal interessante, mas, sobretudo poderia gerar impactos positivos do ponto de vista microeconômico, impulsionando uma melhora de nossa produtividade lá na frente. Do ponto de vista fiscal propriamente dito, as indicações são de que o novo governo pretende levar a cabo duas importantes reformas: tributária e previdenciária. Ambas são muito complexas e carecemos até o momento de informações mais claras sobre qual tipo de reforma será adotado pelo governo Bolsonaro e qual será a sua extensão. O importante aqui, porém, é ressaltar que a direção nos parece correta e que o novo governo entende bem a importância de suas respectivas aprovações.

Dessa maneira, a agenda desenhada pelo novo governo é muito positiva. O risco está em sua implementação.

Tocar uma agenda tão ampla e tão profunda já não seria tarefa fácil mesmo. Ocorre ainda que há muitos temas que dependerão do Congresso Federal, sobretudo o principal deles a reforma da previdência. Ademais, enfrentar todos esses problemas pode ser ainda mais complicado sob o cenário externo que se está desenhando hoje. Esse cenário externo parece-nos complicado sobretudo no primeiro trimestre de 2019.

Talvez o governo Bolsonaro já seja testado na sua largada. Há muito deixamos de lado a percepção de crescimento econômico em sincronia lá fora sob o medo dos impactos da guerra comercial que está sendo travada entre os Estados Unidos e a China. É bem verdade que até o momento o crescimento econômico na China desacelerou, mas talvez este arrefecimento não tenha sido maior tão somente por conta do efeito antecipação das tarifas de exportação que os EUA colocariam sobre os produtos chineses. É possível, portanto, que haja uma desaceleração mais forte no primeiro trimestre do ano.

Na Europa, além da desaceleração que já está em curso, parece que a novela do Brexit poderá ser decidida só mesmo na undécima hora, em março, ou até mesmo estendida para além deste prazo. Ou seja, a incerteza deverá pesar sobre o crescimento da região durante todo o primeiro trimestre do ano, magnificando o efeito que a própria desaceleração da China já terá sobre muitos países que hoje são grandes exportadores para o país asiático. Isso sem contar o efeito econômico já contratado como resultado da onda de protestos sociais que está acontecendo na França.

Em resumo, temos muitos riscos concentrados no início de 2019. Mesmo que nenhum deles se materialize, é possível que o crescimento desacelere apenas pelo efeito negativo da incerteza combinada de todos eles. Se esse for mesmo o caso, o temor de uma desaceleração mais pronunciada da economia mundial aumentará, causando reversões importantes nos mercados ao redor do globo. A boa notícia é que o Banco Central chinês iniciou um programa mais amplo de injeção de liquidez o qual deve se intensificar nos próximos meses, com novos cortes de compulsórios. Além disso, o Banco Central americano deu indicações que deverá pausar o seu ciclo de aumento de juros frente às incertezas domésticas e externas e é possível que em breve o Banco Central Europeu também mude a sua atual comunicação que ainda é muito dura. Do ponto de vista doméstico, avaliamos que a nova equipe está apontando a política econômica para a direção correta. Com esse diagnóstico em mente, o desafio passa, portanto, a ser a execução.

Tendo em vista os riscos externos aqui indicados, parece-nos que a margem de manobra para falhas nesse sentido é pequena, tornando ainda mais necessário o senso de urgência nas pautas prioritárias e, sobretudo, na entrega de reformas estruturais.

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