Descentralização dos recursos

Alexandre Rands Barros
Economista, PhD pela Universidade de Illinois e presidente do Diario de Pernambuco

Publicado em: 12/01/2019 03:00 Atualizado em: 14/01/2019 08:40

Uma das propostas mais insistentemente apresentadas pelo ministro Paulo Guedes é a de descentralização de recursos. Isso significa transferir recursos do governo federal para os governos estaduais e municipais. A ideia é que os municípios têm mais conhecimento das demandas da população, pela proximidade e, por isso, são mais capazes de promover o seu bem-estar. Os economistas adicionam a esse atributo o fato de que a população, estando mais próxima dos centros de decisão, pressionam mais pela eficiente alocação dos recursos públicos. Mas há mais problemas envolvidos nessa política.

A descentralização de recursos pode ser de dois tipos. No primeiro, apenas coloca-se a aplicação efetiva dos recursos nos municípios, enquanto o formato dos programas que o utilizam seria ainda definido pelo governo central. Além disso, a fiscalização e controle deles seriam realizados pelo governo central. No outro tipo de descentralização não há padronização nos programas. Os recursos são descentralizados e os municípios os aplicariam dentro de suas prioridades. Essa seria a mais radical descentralização dos recursos. Teoricamente, esse último tipo dá mais liberdade para que a população realmente escolha as suas prioridades, o que poderia assegurar a melhor aplicação dos recursos públicos.

Essas abordagens, contudo, desprezam um elemento fundamental que existe em todas as sociedades: os custos elevados de informação. Em municípios muito pobres do país, como os que temos aqui no Nordeste, as pessoas não ocupam seu tempo levantando informações sobre políticas públicas. Consequentemente, os recursos ficam livres para a aplicação pelos gestores municipais. Esse excesso de liberdade para os aplicarem de acordo com suas preferências, pode gerar distorções, pois as preferências dos gestores não necessariamente refletem a dos eleitores locais. Esse é um típico problema de risco moral, tão tratado na literatura econômica de agente principal. Além disso, a fiscalização da aplicação dos recursos seria muito baixa dado o pouco empenho da população na fiscalização. Por isso, esse excesso de liberdade provavelmente levará apenas a mais corrupção.

Os programas pré-definidos, por sua vez, têm o inconveniente de serem menos eficazes na promoção do bem-estar da população. Esses programas muitas vezes têm estruturas inadequadas para vários municípios, gerando muita ineficiência nas suas aplicações efetivas nas diversas localidades. Quando chegam para os diversos municípios, há uma clara rebeldia em relação à rigidez do governo federal, o que desmoraliza o programa e aumenta a possibilidade de corrupção por causa dos ajustes informais na aplicação dos programas. Obviamente, se concebidos com bom senso, esse problema se reduz. Mas bom senso é algo em escassez entre os burocratas de Brasília.

Uma saída para esses problemas seria criar um cardápio de programas públicos flexíveis e pouco burocratizado, com uma lógica específica para a distribuição dos recursos entre os municípios. A escolha dos programas seria dada pelas prioridades dos municípios. Assim o controle e auditoria dos diversos programas seria realizada pelos mecanismos nacionais, que são mais efetivos. A escolha das aplicações dos recursos, contudo, seria feita pelos municípios. A competência dos secretários e a eficiência dos gestores nacionais dos programas não seriam mais os determinantes da alocação de recursos entre programas. Ou seja, seria possível alocar os recursos pelas prioridades dos municípios, mas com as estruturas de gestão, controle e auditoria definidas pelos gestores nacionais. Com isso, haveria mais eficiência e maior promoção do bem-estar da população.

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