Editorial Decisão expõe racha do STF

Publicado em: 20/12/2018 03:00 Atualizado em: 19/12/2018 22:42

O ministro Marco Aurélio Mello, do Supremo Tribunal Federal (STF), determinou ontem a liberação de todos os presos condenados em segunda instância, ao acolher a Ação Declaratória de Constitucionalidade 54, apresentada pelo Partidos Comunista do Brasil (PCdoB). A decisão contraria o entendimento do colegiado da Alta Corte. Em pelo menos quatro situações, o STF entendeu que a execução provisória da pena não impede que o preso recorra a todas as instâncias do Judiciário. Para Marco Aurélio, essa compreensão desrespeita o artigo 5º da Constituição: “Ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória”.

A decisão do ministro ocorreu às vésperas do recesso do Judiciário e dois dias depois de o presidente do STF, ministro Dias Toffoli, marcar para 10 de abril do ano que vem a retomada da discussão sobre a controvertida questão. Segundo Marco Aurélio, Toffoli não poderia reverter, monocraticamente, a decisão, que só poderia ser derrubada pela maioria do ministros do STF. Mas há especialistas que garantem que Toffoli poderá se amparar nas decisões anteriores do colegiado para derrubar a liminar.

Mantida a liminar, o efeito imediato seria a liberação de mais de 100 mil presos, entre eles o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, cuja defesa requereu, 48 minutos depois da decisão de Marco Aurelio, ao Tribunal Federal Regional da 4ª Região (TRF-4) a soltura do líder petista.

Os promotores da Operação Lava-Jato reagiram indignados à determinação de Marco Aurélio. Argumentaram que a liminar coloca em risco a Operação Lava-Jato que, desde 2014, desbaratou inúmeros esquemas de corrupção, a começar pela Petrobras, que desviaram bilhões dos cofres públicos. A força-tarefa levou à cadeia dezenas de empresários e políticos, em ações, antes, inimagináveis no país, onde os rigores da lei não alcançavam congressistas nem os detentores de poder econômico.

As consequências da determinação de Mello não se restrigem às quase 60 fases da Lava-Jato. A decisão expõe a fratura que existe no colegiado do Supremo Tribunal Federal que, ao longo do ano, protagonizou debates bastante agressivos entre os ministros. À opinião pública passou a ideia de que os diferentes matizes políticos orientavam o comportamento e as decisões do magistrados.

Mais: a decisão reforça o ambiente de insegurança jurídica e coloca em xeque a credibilidade do Judiciário, cuja imagem está bastante esgarçada por um conjunto de ações que tem merecido a crítica de diferentes setores da sociedade. O dito popular “cada juiz uma sentença” ganha contornos bem mais fortes, quando a interpretação da lei é tão variável quanto a personalidade dos seus operadores. A falta de consenso ou de aplicação horizontal dos marcos legais embaça a imagem do país e coloca em xeque o papel das instituições que, como o STF, são os pilares do Estado democrático de direito.

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