Título de Doutor Honoris Causa para o prof. Robert Alexy

João Maurício Adeodato
Professor e Pesquisador em Direito
opiniao.pe@diariodepernambuco.com.br

Publicado em: 04/12/2018 03:00 Atualizado em: 05/12/2018 10:15

Nós sabemos da tradição alemã na música, mas talvez na filosofia essa influência seja ainda mais importante. E certamente, em relação à Faculdade de Direito e à Escola do Recife, a filosofia alemã sempre prevaleceu. Pois bem, Robert Alexy é o mais importante filósofo do direito alemão vivo.

Ele nasceu em Oldenburg, na Baixa Saxônia, em 9 de setembro de 1945 e fez o doutorado na Faculdade de Direito da Universidade de Göttingen, sob orientação do prof. dr. Ralf Dreier em 1976, do que resultou seu livro Teoria da Argumentação Jurídica – A teoria do discurso racional como teoria da fundamentação jurídica, o qual, juntamente com sua tese de cátedra Teoria dos direitos fundamentais, tornaram-se clássicos na filosofia do direito, na teoria do direito e no direito constitucional contemporâneos. Foi catedrático da Faculdade de Direito da Universidade de Kiel, da qual se aposentou recentemente para uma vida de palestras e honrarias, como as que recebe hoje e amanhã em nossa cidade do Recife. Dentre centenas delas, em 2010 recebeu a Ordem do Mérito da República Federal da Alemanha.

Sua carreira brilhante lhe valeu ter se tornado um dos autores mais citados no mundo inteiro, e, o que mais impressiona, especialmente no Brasil. Isso porque suas ideias não são somente discutidas pela doutrina e nas faculdades de direito, mas sobretudo aplicadas pelo Supremo Tribunal Federal e pelos magistrados de todas as instâncias, exercendo papel decisivo na construção do direito positivo nacional e internacional.

Eu o conheci em 1989, em um congresso em Göttingen, e desde então nos encontramos algumas vezes em diversos eventos de filosofia do direito, até ele finalmente poder atender ao convite e vir pela primeira vez a Pernambuco. Para tornar este momento possível, foi necessária uma logística que envolveu várias instituições de todo o país. Aqui em Pernambuco, além da Universidade Federal e sua Faculdade de Direito do Recife, o Tribunal de Justiça e sua Escola da Magistratura foram decisivos e essenciais. A todos agradeço em nome da comunidade jurídico-científica do estado.

A filosofia do professor Robert Alexy não pretende universalizar as diferentes ordens jurídicas dogmáticas, mas sim desvelar os valores consagrados pelo direito positivo. Esse desvelamento não consiste em simplesmente descrever os valores tais como se apresentam no jogo do poder, porém também indicar o caminho para que se realizem da maneira mais racional possível. Nesse sentido, os direitos fundamentais prevalecem porque revelam a racionalidade da natureza humana e não apenas porque são desejáveis de uma perspectiva axiológica, ou porque são protegidos por esse ou aquele ordenamento jurídico efetivo. Essa racionalidade se mostra por meio da argumentação.

Seguindo os ensinamentos de Immanuel Kant (1724-1804), a argumentação jurídica para Alexy consiste em um caso especial do discurso prático em geral, haja vista que também se dirige a questões da razão prática, sobre o que se deve ou não fazer, guiada pela pretensão de correção (Richtigkeit) ou justiça (Gerechtigkeit). Para a racionalidade da argumentação, Alexy divide as teorias contemporâneas que procuram compreender e explicar o direito em duas direções: as que seguem a tese da vinculação entre direito e moral (Verbindungsthese) e as que seguem a tese da separação entre essas duas ordens normativas (Trennungsthese).

O que todas as concepções positivistas teriam em comum é exatamente a convicção dessa separação. E Alexy utiliza diversos casos práticos para demonstrar que essa separação é equivocada. Sua tese, dentro das que define como não positivistas, é a de que existem vinculações necessárias entre direito e moral, tanto vinculações epistemológicas (analíticas) quanto vinculações axiológicas (normativas). Essa crítica ao positivismo dominante, fundamentada de maneira sólida e erudita, tem sido expressamente invocada pelo Supremo Tribunal Federal, sempre que princípios e direitos fundamentais entram em colisão.

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