Vida Urbana

Contrabando lidera venda de cigarros em Pernambuco

Entre 2015 e 2017, o comércio ilegal provocou um prejuízo fiscal de R$ 204 milhões. Vigilância Sanitária alerta para os risco à saúde. Já foram encontrados até pelo de ratos e insetos em produtos piratas

Polícia Rodoviária Federal apreendeu em Pernambuco 1,18 milhão de maços de cigarros contrabandeados. Foto: Divulgação

Mais da metade dos cigarros (51%) comercializados em Pernambuco são contrabandeados. O levantamento foi feito pelo Instituto Brasileiro de Ética Concorrecional (ETCO) e pelo Fórum Nacional Contra a Pirataria e Ilegalidade (FNCP). Localizado no centro do Nordeste, o estado tem uma posição geografica que facilita a distribuição das cargas vindas do Paraguai, principal rota do tráfico, além disso Pernambuco divide fronteira com cinco dos outros oito estados da região. O que acaba favorecendo a ação criminosa. Entre os anos de 2015 e 2017, o comércio ilegal do produto provocou um prejuízo fiscal ao estado de R$ 204 milhões. Mas não é só isso. O contrabando traz também um dano ainda incalculável ao homem. Sem controle sanitário adequado, esses cigarros são altamente nocivos à saúde dos consumidores. 

Resolver a questão é um problema complexo, uma vez que passa pela regulamentação tributária dos países vizinhos, principalmente como o Paraguai, diz o presidente do ETCO, Edson Vismona, também especialista em segurança pública. “Se não houver aumento de imposto no Paraguai sobre a venda de cigarros, fica difícil combater a ilegalidade”, alega o executivo.  Nos últimos cinco ano, a desigualdade tributária só aumentou. O imposto sobre o setor subiu 140%. Enquanto a venda ilegal subiu 9%, a comercialização legal baixou 8%. Segundo Vismona, no Paraguai é cobrado 16% sobre a venda de cigarros, enquanto que no Brasil, de 70% a 90%. "A vantagem é tão grande, quase um incentivo a criminalidade", comenta. 

Vismona ressalta ainda que o governo precisa dar mais apoio técnico e operacional à execução do Plano Nacional de Fronteiras, especialmente na divisa com o Paraguai. Atualmente, o cigarro é responsável por cerca de 48% de todo o contrabandeado no Brasil, sendo que 3% são fabricados no Brasil e 45% são contrabandeados. O tráfico de cigarros representa cerca de 67% das apreensões no Brasil. "Por isso, lutar pela redução do contrabando é fundamental para combater o aumento da violência urbana em todo o País", defende.

Mas os prejuízos não são apenas fiscais. Na linha direta de venda comerciantes já relatam uma queda nas vendas. O empresário Marcos Miranda, dono de 13 postos de combustíveis na Região Metropolitana do Recife, diz que nos últimos dois anos, a venda de cigarros em sua rede caiu 20%. "A gente percebe que nos postos localizados na Zona Norte, a queda é ainda maior", comenta. 

CONTRABANDO - Segundo a pesquisa da instituição, 15 setores perdem mais de R$ 100 bilhões por conta da ilegalidade por ano. Além do cigarro, os setores de vestiário, medicamentos e óculos são também afetados diretamente pelo contrabando. Já as perdas com contrabando, falsificação, pirataria e sonegação alcançaram R$ 146 bilhões no ano passado. "Sem falar no aumento provocado pelo incremento do risco à saúde, pela ocupação das forças de segurança com a prevenção a tais práticas, e, até, com a corrupção que acompanha o contrabando. Tais perdas são, em muito, aumentadas, se, ao cigarro, somarmos os produtos eletrônicos, os perfumes e as bebidas alcoólicas”, observa Edson Vismona. 

De acordo com o levantamento do instituto, quatro das dez marcas mais vendidas no Brasil são clandestinas. "A margem de lucro é grande. Quando sai da fábrica, cada maço custa cerca de 20 centavos e chega ao consumidor final ao preço de R$ 2,50 a R$ 3. Infelizmente, a marca líder de vendas no Brasil é contrabandeada", explicou Vismona.  

Com relação à composição das apreensões, o cigarro lidera o ranking da ilegalidade, correspondendo a 38% das mercadorias apreendidas no ano passado. No total, foram apreendidos 20 milhões de maços de cigarro, o que corresponde a, aproximadamente, R$ 100 milhões. Na sequência estão eletrônicos e informáticas, com 22% e 7%, respectivamente. 

O cigarro é hoje o produto mais contrabandeado do Paraguai para o Brasil. A participação de mercado do tabaco paraguaio saltou de 20% em 2011 para 45% em 2016, um prejuízo de R$ 9,7 bilhões aos cofres públicos em 2017. Cigarros paraguaios podem ser encontrados por um valor médio de R$ 3,30, enquanto que os produtos legais possuem um preço mínimo de R$ 5,00 e são vendidos por uma média de R$ 7,40. O imposto que incide sobre o produto é de, em média, 70% no  Brasil, podendo chegar a quase 90% em alguns estados, contra 16% no país vizinho.

Polícia Rodoviária Federal apreende 1,18 mihão de maços
 
A Polícia Rodoviária Federal em Pernambuco (PRF-PE) informa que, no ano passado, foram apreendidos 1,18 milhão de maços de cigarros (23,6 milhões de unidades) nas rodovias federais que cortam o estado. Este ano, de janeiro a julho, as apreensões já somam o registro de 25,5 mil maços de cigarros, 510 mil unidades do produto. A maioria tem origem paraguaia. 

De acordo com a PRF-PE, a fiscalização é dificultada porque os produtos muitas vezes são ocultados em maio a cargas ilícitas. Misturados à outras mercadorias, os cigarros acabam passando pelos postos de fiscalização. A PRF-PE informou que tem buscado uma maior integração com outros órgãos para ampliar as apreensões e chegar à prisão não somente de quem transporta a mercadoria, mas também de quem gerencia esse tipo de contrabando. 

Na semana passada, a Polícia Civil de Pernambuco incinerou uma tonelada de cigarros contrabandeados do Paraguai, apreendidos em três grandes operações este ano.  Segundo o delegado Antônio Guerra, titular da Delegacia de Crimes contra a Propriedade Imaterial (Pirataria), as marcas mais comuns não autorizadas pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) são Mix 10 Mild, US, GT, Classic, Midhth Silver, Midhth Gold, Meridien Box, Gift Box, US Mild, Pine Red, Pine Blue, Golf, R7, entre outros. Segundo a Polícia Federal, os cigarros paraguaios entram no Brasil pela fronteira em Foz do Iguaçu depois seguem para São Paulo, de onde são espalhados para todas as capitais do país. 

LEGISLAÇÃO - Desde 2014, quando foi publicada a Lei 13.008, as penas para os crimes de contrabando estão mais severas no Brasil. O dispositivo deu nova redação ao artigo 334 do Código Penal. Quem vende cigarro de origem ilegal, expoem à venda, mantém guardado, compra, recebe, oculta, ainda que em casa, incide em crime de contrabando e está sujeito à pena de 2 a 5 anos reclusão. 

O delegado lembra que ainda podem estar sujeitos ao artigo 95, inciso IV da Lei 9.279/96 (crime da concorrência desleal), cuja pena vai de três meses a um ano de detenção; no artigo 7°, inciso IX, da Lei 8.137/90 (crime contra relação de consumo), que tem penas de dois a cinco anos e, no artigo 18, parágrafo 6°, inciso II da Lei 8.078/90 (crime contra o consumidor), com penas de seis meses a dois anos. O somatório das penas pode dar mais de dez anos de reclusão. Se houver antecedentes, pode se agravar", acrescenta. 

No ano passado foi lançado o Movimento Legalidade com o objetivo de combater o contrabando no país e os prejuízos que tem causado à indústria e ao comércio. Depois de São Paulo, Recife foi a segunda capital do país a assinar o compromisso de intensificar ações contra o mercado ilegal. O documento foi assinado pelo prefeito Geraldo Julio em novembro passado. 

O Movimento Legalidade atua em cinco frentes com articulação de ações de combate ao comércio ilegal, movimento sustentável de aproveitamento das apreensões e descarte de produtos, educação do comerciante sobre práticas ilegais, simplificação de práticas e posturas e campanha de comunicação. 

Pelos de ratos e insetos em cigarros contrabandeados
 
O consumo de cigarros ilegais também põe em risco à saúde pública. Em várias amostras foram encontrados pedaços de plástico, graos de areia, metais, insetos e até pelos de ratos. O gerente da Agência Pernambucana de Vigilância Sanitária (Apevisa), Jaime Brito, alerta que o consumidor verifique se o produto que compra é legal.

"É possível verificar no site da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) a lista dos cigarros legais que podem ser comercializados, de acordo com as normas da vigilância sanitária. Se não tiver nessa relação, não compre pois se trata de produto ilegal, que pode fazer muito mal à saúde", observou. O endereço eletrônico para consulta é o http://portal.anvisa.gov.br/tabaco/consulta-a-registro

Um estudo divulgado no ano passado pelo Instituto de Desenvolvimento Econômico e Social de Fronteiras (Idesf), em 18 marcas de cigarros paraguaios foram encontradas substâncias cancerígenas e tóxicas em níveis 11 vezes acima do permitido no Brasil. Substâncias que podem causar distúrbios de memória, de comportamento, dor de cabeça crônica, alterações intestinais e maior vulnerabilidade a vários tipos de câncer. 

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