A guerra dos sexos: memória, humor e amor

Luzilá Gonçalves Ferreira
Doutora em Letras pela Universidade de Paris VII e membro da Academia Pernambucana de Letras

Publicado em: 19/03/2019 03:00 Atualizado em:

O título acima é uma espécie de roteiro para a palestra acontecida na Academia Pernambucana de Letras, em uma das nossas reuniões quinzenais. Resultou de pesquisa sobre as Transfigurações da memória, parte do curso de extensão que acontece a partir do dia 23 de março e até o mês de maio. A fala inicial deste sábado pertence ao professor Lourival Holanda crítico literário, doutor em filosofia, que discorre sobre o momento que o mundo está vivendo, nós todos até aqui confiados na razão, adeptos de Descartes, e levados ou obrigados agora,  a uma revisão, releitura, ou deslocamento de nossas certezas absolutas: como reinventar outros modos de viver? Após a fala de Lourival, esta escriba tentará mergulhar na memória de mulheres, ou do que nos deixaram algumas representantes da gente feminina, através dos tempos. Uma aposta cujo resultado só pode ser aproximativo: se falou tanto no silêncio das mulheres na história da humanidade, e quando a gente chega perto, descobre que esse é um silêncio relativo, que de fato, como afirma Michèle Perrot, em As mulheres, ou os silêncios da história, existe hoje e já há alguns anos, “uma vontade de fazer a crítica do saber constituído” que tem modificado o grau de adesão das mulheres à figuração que se fazem delas próprias. Em nosso encontro de ontem, na APL, comentamos alguns momentos na literatura, no folclore, em que a atuação das mulheres se mostrou risonha, bem humorada, crítica até, impondo-se contra a autoridade dos homens, contra o domínio que os homens têm ou julgam ter sobre elas, sobre sua vontade, sobre seu corpo. Na idade média, multiplicam-se composições literárias, novelas ou contos,  de autoria de mulheres  na maioria das vezes, ou de autoria de homens que assumem a fala feminina. Em canções, textos reivindicativos, sérios ou debochados, como aquela esposa que pergunta|: “por que meu marido me bate? Só porque fui encontrar meu amante?” ou aquela que não resiste em comer as perdizes que preparara para o marido caçador, destinadas a ele e ao padre, e que inventa uma mentira para se justificar. Ou ainda outra, do folclore franco-canadense, Mon mari est bien malade (meu marido está muito doente), que sai buscar médico mas vai devagarzinho e que, ao saber que do esposo falecera, protesta porque usaram um corte de tecido que ela guardara para um vestido, e descose, ponto por ponto a mortalha. Fazem parte desse acervo as chamadas Canção da Malcasada (malmaridada, na Espanha,  maumariée na França), de teor cômico ou trágico quando a moça prefere se suicidar para evitar um marido que não ama, tema explorado por cantores modernos como Anne Sylvestre e Serge Reggiani. E, claro, uma temática apaixonada como nos poemas de Elisabeth Barret Browning (traduzida por Manuel Bandeira), de Gilka Machado ou de Florbela Espanca Todo um mundo a merecer muito mais que uma simples palestra

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