Ato obsceno?

Gilberto Marques
Advogado criminal

Publicado em: 09/03/2019 03:00 Atualizado em: 09/03/2019 20:24

O carnaval se enchia de cores. A música dos blocos, troças, caboclinhos, maracatu, samba, espraiava alegria. Noite e dia. Os postes eram enlaçados com cornetas sonoras. Tocando frevo. Zé Pereira cresceu a farra, a partir do sábado. O bairro de São José, de portas abertas, recebia parentes, amigos, vizinhos. Olinda fustigava o sobe e desce das ladeiras. Enfeitadas nas janelas, repletas nas calçadas, bandeirolas coloridas. Lá e cá três dias de folia. O carnaval do Rio dava notícia com samba, marchinhas, marcha-rancho. Cidade Maravilhosa é o hino carioca. Em Salvador crescia no batuque. O Trio Elétrico alimentava a romaria. Em Pernambuco, os Rozemblit profissionalizaram o acervo. Claudionor Germano agrega, até hoje, corais femininos. O cardápio das partituras crescia, ano após ano. Os vários ritmos que musicariam crônicas da época: Gagarin subiu, subiu, subiu, foi até o espaço sideral; ouvi dizer que numa mulher, não se bate nem com uma flor; você tem quase tudo dela, o mesmo perfume, a mesma flor.

No canto dos contos somavam-se a picardia, o mote, a criatividade: vem cá seu guarda bota pra fora esse moço; queiram ou não queiram os juízes o nosso bloco é de fato campeão. Do Rio Zé Queti, sugere o beijo furtado: vou beijar-te agora não me leve a mal, pois é carnaval. A melindrosa numa roupinha sumária adaptou-se ao calor da época. As escolas do Rio arrancaram o soutien. O beijo da Máscara Negra migrou para o corredor de Olinda. Nesse compasso o salão bolinava o beijo genérico. A maioria consentido. Recentemente incriminado com pena alta. O constrangimento ilegal de 1940, perdeu o vigor, com a Importunação de 2018.

Mamãe contava do corso, sem mela-mela. Fustigando amizades, com troca de doces, perfumes lançados de um carro para outro. O lança-perfume da Rodhia, Rodouro, inebriante nos salões dos clubes. Cheiro bom que se espalhava no ambiente. Já na pré-adolescência, andamos no percurso da Concórdia, arrodeava a ilha do Recife. A coisa mudou: talco, água, carro sem porta, sem regra. O barulho do escape aberto, ensurdecedor. Bebida na mão do motorista sem habilitação.

Agora é frevo. Após os clarins a orquestra soa o Vassourinhas e sai por aí. Carnaval tem todo ano, dizia papai: vá devagar. Em 2019, a cobra fumou. Dois exibicionistas, de membro em punho, trocaram jatos de urina e outras coisitas pervertidas. Celulares na mão, cinema no ar. A conta do presidente encheu os olhos. Salvou o vídeo pornô. Mandou às nuvens. O exibicionista é portador de distúrbio psiquiátrico. Em tese, cai na descrição do artigo 233 Código Penal brasileiro – Praticar ato obsceno em lugar público, ou aberto ou exposto ao público: Pena – detenção, de 3 (três) meses a 1 (um) ano, ou multa. Mas, quem expõe... à venda ou ao público... dizem o caput, o Parágrafo Único e o inciso I, do artigo 234, vizinho, corre o risco da detenção de 6 (seis) meses a 2 (dois) anos. Para surpresa internacional, o dono da assinatura do Twitter, avassalador, é o próprio chefe do Executivo Nacional. Fazer um inocente xixi na rua deu xilindró a vontade. Delegacias suspenderam a folia dos urinadores públicos. Se bem que há muito folião para pouco penico. O Galo que o diga. No entanto, os atores da pornolândia tiveram um número infinito de exposição. Sem a mão do clip cibernético não passariam de 40 (quarenta) curiosos. Alguém me disse que os dois détraqué cantaram alto: vem pessoal, vem moçada, carnaval termina numa grande presepada. Até quarta-feira meu bem, não leve a mal, é tudo carnaval...

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