Quando a sociedade cospe no Judiciário

Rivail Virgilio Chaves
Oficial de Justiça, bacharel em Direito, pós-graduado em Direito Processual, pós-graduado em Direito Público, mestrando em Direito Penal.

Publicado em: 07/03/2019 03:00 Atualizado em: 07/03/2019 09:30

Não seria o uso do verbo cuspir, no título deste artigo, a minha primeira opção. Entretanto resolvi usá-lo em substituição aquele que seria a opção número um por ser menos agressivo a escrita e a linguagem culta e jornalística, mesmo ainda achando que o verbo que deixei de usar melhor espelharia o atual momento brasileiro de incredulidade e desrespeito às instituições.

Conforme noticiado nos veículos de comunicação, uma pernambucana que mora nos EUA encontrou um desconhecido morando em sua casa de veraneio, em Porto de Galinhas. A proprietária buscou o Poder Judiciário, que logo deu a resposta. Contudo, o réu invasor, ao deixar o imóvel, e na certeza da impunidade civil e criminal, deixou um bagaço aquela propriedade. A mulher, estarrecida, não quis acreditar no que seus olhos estavam testemunhando porque coisa do tipo, no país onde ela reside, jamais aconteceria, sem que no mesmo dia fosse expedido um mandado de prisão.

No desempenho de meu mister de Oficial de Justiça, intimei uma ré para que, em 30 dias, desocupasse voluntariamente uma casa. Diante da desobediência, o caminho legal seria a desocupação compulsória, que já estava sendo preparada. Ocorreu que, na véspera desse ato de força, eu recebo um telefonema da autora, que aos prantos me dizia que o imóvel não existe mais, pois a invasora o havia derrubado. De fato encontrei a “casa” no chão. Não estou aqui dizendo que a ré tirou os telhados e as portas. Não!  Ela literalmente derrubou a casa, não restando tijolo sobre tijolo.

Ao tentar cumprir um mandado de apreensão de um veículo na casa de um casal de advogados, estes me ofereceram 2 mil reais para eu deixar de proceder com o ato. Diante da recusa, o marido entrou no carro e se evadiu, dizendo que no Brasil “leis e justiça são duas m...”. Dias passados, em dois processos também de apreensão de veículos, um réu e uma ré desdenharam do Poder Judiciário e também se evadiram com as respectivas motocicletas objeto da ação. E sempre de forma agressiva.

“Ora, o senador Renan Calheiros não recebeu o Oficial de Justiça, e por que eu iria receber o senhor?”, disse-me uma ré em um processo cível. “Quem dá as costas para o Oficial de Justiça, dá as costas para o Poder Judiciário”, nas palavras da ministra Carmem Lúcia, do STF, no episódio envolvendo o senador citado. Diante destes casos telados e de tantos outros que ocorrem diariamente não há a menor dúvida de que a sociedade, independente de classe social, está cuspindo na cara do Poder Judiciário.

É a desordem do andar de cima trazendo seus reflexos e contaminando o andar de baixo. São juízes, membros do MP e da PF fazendo política, pleiteando privilégios e em constante e promíscuo lobby nos respectivos Legislativos; procuradores da República deixando de demonstrar o inconformismo nos autos trocando-o por ataques a magistrados pela TV; são juízes e membros do MP se comportando como moleques nas redes sociais e em sociedade; é procurador da República fazendo orações pela prisão de determinado processado, numa clara demonstração de parcialidade nos seus atos. E assim chegamos ao atual estágio de descrédito e desrespeito às instituições. E quando o descrédito alcança o Poder Judiciário, traz consigo o desmoronamento da sociedade. Pobre Brasil!

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