Editorial Meio ambiente é coisa muito séria

Publicado em: 12/12/2018 03:00 Atualizado em: 12/12/2018 08:48

É auspicioso ouvir do ministro indicado para o Meio Ambiente, Ricardo de Aquino Salles, que a condução de sua pasta será técnica, não ideológica. É importante, porém, entender o que o político, que foi derrotado na disputa por uma vaga de deputado federal por São Paulo, chama de visão ideológica. A defesa ferrenha que especialistas fazem da preservação da terra nada tem a ver com ideologia nem com romantismo de “bicho grilo”. É coisa séria.

Cuidar do meio ambiente é garantir a vida do homem na Terra, e isso já foi evidenciado pela ciência não em um, 10 ou 100 artigos publicados nas mais renomadas revistas especializadas, como Nature e Science. São milhares, literalmente, de trabalhos. O mais robusto, que compila informações científicas de qualidade e, a partir delas, faz um detalhado diagnóstico dos custos do aquecimento global para o planeta, é o relatório do Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas, um grupo de estudos da ONU composto por cientistas renomadíssimos. Eles têm feito repetidos alertas sobre os riscos de não se limitar a 1,5ºC o aumento da temperatura até 2050, tendo como base os níveis pré-industriais. O aquecimento global, por sinal, é visto como tema de segunda classe pelo futuro ministro.

É verdade que, ao longo da história de 4,5 bilhões de anos, a Terra passou por ciclos de aquecimento e resfriamento. Porém, era um fenômeno natural, que levava milhões de anos para ocorrer. Em contraste, desde o início da industrialização, no século 18, o planeta esquenta em níveis recordes. Do século 19 para cá, houve crescimento de 1ºC na temperatura média, o suficiente para ameaçar a vida nos países-ilhas (sujeitos a alagamentos constantes), acelerar o processo de desertificação do Cerrado e das florestas tropicais e alterar o ph dos oceanos, provocando a morte de espécies de peixes essenciais para a alimentação humana.

O desmatamento desenfreado contribui muito para isso. Ao mesmo tempo em que lançam oxigênio para a atmosfera, as árvores têm um papel importantíssimo, de, por meio da fotossíntese, estocar carbono no subsolo. Derrubar florestas significa permitir que todo esse CO2 armazenado seja lançado na atmosfera. Quanto a isso, não se tem o que discutir: é uma fórmula matemática. Renegar as mudanças climáticas e os efeitos nefastos do desmatamento equivale a duvidar de Darwin. As evidências estão todas aí. Nos últimos anos, o mundo passou por eventos extremos, com ondas de calor e enchentes letais, conforme previa a ciência. Mas muitos preferem atacar fiscais ambientais, que arriscam as vidas e, mesmo com orçamento pífio, que dificulta as diligências, conseguem evitar cenários piores do que aqueles que já temos.

Outro ponto importante: os mercados europeus estão de olho na certificação ambiental dos produtos que importam. Se o Brasil insistir em retroceder e deixar de investir em opções sustentáveis dos produtos agropecuários, vai perder feio. Meio ambiente e economia estão cada vez mais entrelaçados. Não à toa, o prêmio Nobel de Economia deste ano foi para William Nordhaus e Paul Romer, cujos estudos evidenciam os impactos econômicos das mudanças climáticas e apontam para a necessidade do crescimento sustentável. Ir na direção contrária disso tudo será condenar o país ao suicídio. Certamente, não é isso que Salles pretende. Mas ele precisa dar mostras claras de que não cederá às pressões em favor de grupos poderosos.

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