A importância da primeira infância

Michele Almeida e Silva
Psicóloga e consultora da primeira infância

Publicado em: 24/11/2018 03:00 Atualizado em: 25/11/2018 21:06

A primeira infância é o período que vai do nascimento aos seis anos de idade. É o momento que as experiências, aprendizados, descoberta e afetos são levados para o resto da vida. Deixando marcas profundas no cérebro com a falta de estímulo, de cuidados, violência, despreparo dos cuidadores e educadores no começo da vida. Habilidades como linguagem ou raciocínio lógico começam a ser desenvolvidas já durante a gestação, mas até a primeira infância, elas são definitivamente consolidadas. Os primeiros anos de vida é o momento em que o cérebro, se estimulado adequadamente, atingirá o seu potencial máximo de aprendizado (plasticidade). Pesquisadores descobriram que nessa fase o cérebro da criança é moldado a partir das experiências que ela tem, e do ambiente que ela vive. Até os três anos de idade, o cérebro cresce e se desenvolve a uma velocidade surpreendente. É quando a criança aprende a enxergar, detectar sons, andar, falar, identificar quantidades e construir uma série de outras habilidades. Esse processo, com ritmo decrescente, continua até os seis anos, A partir daí inicia-se uma época crucial para o desenvolvimento da personalidade, do caráter e das habilidades fundamentais.

Nessa fase inicial, as crianças vão aprender com estímulos, tanto positivos quanto negativos. Passar por situações de carinho e acolhimento ou por momentos de estresse vão ambos influenciar a vida adulta. Ir a uma creche ou pré-escola de qualidade vai beneficiá-la, enquanto uma de baixa qualidade pode trazer prejuízos ao desenvolvimento, relacionamentos e na forma como o indivíduo se colocará no mundo no futuro. As experiências de qualidade entre os 0 e 6 anos estão relacionadas ao sucesso durante toda a vida escolar. O caminho inverso também vale: os déficits que forem surgindo pelo caminho tendem a crescer e se tornar mais difíceis de superar nos anos seguintes. Corrigir essas deficiências é muito mais trabalhoso, e mais caro, do que investir em um ensino consistente e consciente desde a primeira infância.

Nas diversas áreas da formação como linguagem e competências emocionais, funções cognitivas como a atenção, a memória, o pensamento crítico e o planejamento, já estão se desenvolvendo na primeira infância, ainda que continuem se refinando na adolescência. Essas habilidades surgem quando a criança precisa controlar seus impulsos, prestar atenção ou cumprir regras. Já foi comprovado que crianças que, desde cedo, são orientadas a persistir, lidar com o fracasso e resolver problemas têm mais chances de se formar no Ensino Médio e na faculdade. O índice de evasão escolar também diminui. Proporcionar maior qualidade na educação infantil favorece uma maior possibilidade de um emprego estável e com salário mais altos no futuro. Isso gera um ciclo de desenvolvimento. Não basta construir creches ou pré-escolas, precisa investir na qualidade, na capacitação e no desenvolvimento contínuo dos cuidadores e educadores da educação infantil.

As características da personalidade da criança vão se formar entre os 0 e os 3 anos de idade, e as experiências mais marcantes partem dos relacionamentos que a envolvem, destacando-se os pais, os parentes, e os cuidadores ou professores. Crianças que recebem cuidados de qualidade desde o nascimento, seja com a família ou na escola, ainda têm menos chances de desenvolver problemas de saúde física e mental. Esses cuidados envolvem não somente o ensino, mas a saúde, a nutrição, o acompanhamento médico adequado, o afeto e a sensação de segurança.

Uma primeira infância de qualidade faz com que os índices de violência e criminalidade durante a adolescência e a vida adulta caiam. Também diminuem os casos de suicídios e homicídios, segundo pesquisas. Integrar áreas em prol da primeira infância, oferecer creches e uma educação de qualidade para as crianças da primeira infância, favorecendo aprendizagem através dos cuidados, da descoberta e do aprendizado, é a luta de profissionais da saúde que entendem que a formação do indivíduo começa na gestação e é levada para a vida adulta transformando uma sociedade. É construir hoje, para que a criança seja as mudanças no mundo de amanhã.

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