Arthur Lima, uma figura Nabuqueana

Luiz Otavio Cavalcanti
Ex-secretário de Planejamento e Urbanismo da Prefeitura do Recife, ex-secretário da Fazenda de Pernambuco e ex-secretário de Planejamento de Pernambuco.

Publicado em: 17/11/2018 03:00 Atualizado em: 17/11/2018 20:03

Arthur Lima era um homem bonito. Por dentro e por fora. Eu o conheci profissionalmente, na Fidem. E socialmente, em reuniões nas quais se mostrava pernambucanamente afável e inteligente.

Mas eu não sabia de detalhes de sua atuação política. De sua altura moral. Sua correção pessoal. Somente depois de ler os originais de sua biografia, cedidos por sua filha, Marta, vi o mar que foi sua vida. Agitado. E belo.

Arthur não era um. Era muitos. Começou empresário. De êxito. Sócio de Gildo Guerra. Foi arquiteto premiado em concursos aos quais concorreu em São Paulo e em Pernambuco. Foi político, tocou as nuvens no seu idealismo irrealizado. E lidou com as pedras da realpolitik em período cinzento da República.  

Exerceu mandato de vice-prefeito do Recife, em 1960. Recusou ser candidato a prefeito, apoiado pela UDN, Partido de direita. Para ser fiel à Frente do Recife, movimento de esquerda. Foi eleito deputado federal, em 1962, pelo PTB, sendo cassado em 09 de abril de 1964.

Foi eleito deputado estadual, em 1982, pelo PMDB. Participou de intensas negociações pela democracia nos anos de 1960 e 1970. Principalmente em conversas com colegas parlamentares, intelectuais, com o ex-presidente João Goulart e o ex-governador da Guanabara Carlos Lacerda.

Articulou a formação da Frente Ampla contra o regime militar. Que reuniu, no mesmo púlpito, Juscelino Kubitschek, João Goulart e Carlos Lacerda. O manifesto da Frente foi publicado em 27 de outubro de 1966.

No desempenho do mandato federal, acentuou sua vocação de urbanista. Apresentou à Câmara dos Deputados projeto de lei criando o Conselho Nacional de Política Urbana. Era um urbanita. Preocupado com mobilidade e qualidade de vida nas cidades. Nesse sentido, foi um antecipador das ideias de Jaime Lerner.

Cobrindo suas atividades como político, como gestor e como formulador, Arthur vestia a roupa de perfeito humanista. Que lhe coube muito bem. Para ele, sobressaíam valores. O senso do coletivo, o respeito à opinião alheia, a decência. Era um iluminista.    

Arthur viveu numa época da política brasileira na qual a palavra foi cortada pela força. Ele mostrou-se, como democrata, insubmisso. Lutou, articulou, viveu no discurso intimorato a aspiração serena dos convictos. Uma época na qual a geologia dos fundamentos democráticos estava sendo redefinida. As placas tectônicas da democracia brasileira produziam rumores que viriam moldar o terreno da abertura somente em 1985.

Um Brasil nascente, ardente, foi enterrado então. Mas Arthur permaneceu ligado nas coisas do país. Sem perder o vigor das ideias. Num percurso proustiano. Em busca de si próprio. De seu iluminismo tropical. Era incansável. No falar. No gesticular. Seu gestual era largo, mediterrâneo. Sua peregrinação era incontornável. E, ao chegar ao porto do arremate verbal, ele se abria num sorriso magnífico. Cativante.

Figuras, como Arthur, abrem paralelos. Lembram outros cumes da história pernambucana. Lembro de Joaquim Nabuco. Arthur era elegante, como Nabuco. Arthur era formulador, como Nabuco. Arthur era um antecipador em relação a seu tempo, como Nabuco. Arthur era fisicamente bonito, como Nabuco. Arthur era eticamente reto, como Nabuco. Arthur era descendente da aristocracia, como Nabuco. Arthur tinha o sentimento da pobreza, como Nabuco. Arthur era Nabuco no século 20.

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