O despertar da primeira infância

Michele Almeida e Silva
Psicóloga e consultora da primeira infância

Publicado em: 20/10/2018 03:00 Atualizado em:

Vários estudos acadêmicos recentes têm mostrado que a primeira infância, período que vai do nascimento aos seis anos de idade, é o momento de nossas vidas em que alicerçamos as bases para todo o desenvolvimento intelectual e emocional de nossas vidas. Cuidados adequados nessa fase da vida são fundamentais para a felicidade futura das pessoas. Investimentos feitos para tal nessa fase da vida são os que apresentam melhor retorno individual e social. Eles podem ter impactos futuros importantes, desde melhorar o desempenho escolar dos alunos, passando pela redução futura da criminalidade, e fomentando o aumento da produtividade do trabalho futuro. Ou seja, sociedades que buscam se desenvolver e promover a felicidade dos seus membros precisam investir forte e de forma adequada nessa fase da vida deles.
O Brasil começa a despertar para tal preocupação. Recentemente, no Marco Legal da Primeira Infância (Lei 13.257/2016), foi aprovada a recomendação para a elaboração pelos municípios do Plano Municipal pela Primeira Infância (PMPI). Ele é um instrumento político e técnico importante para levar essa intenção para a prática concreta. Se alicerçado na decisão política de prefeitos(as), ele deverá olhar para todas as crianças do território municipal e, com os dados fornecidos pelo diagnóstico, planejar as ações para os próximos 10 anos que melhor assegurem o desenvolvimento pleno das crianças, tendo como parâmetro os direitos da criança na Primeira Infância, e a partir de um processo democrático amplamente participativo, com integrantes do governo e da sociedade. Obviamente caberá ao Poder Legislativo municipal discutir e aprovar o Plano, dando-lhe força de lei. A elaboração de bons PMPI pode potencializar as ações do Conselho de Direitos da Criança e do Adolescente e de outras instituições governamentais e da sociedade civil que atuam no atendimento às crianças para tornar mais eficiente as ações coletivas direcionadas a elas. 
Ações de mobilização e articulação pró-PMPI junto à mídia local, aos gestores de políticas públicas, ao legislativo local, e aos diversos segmentos da sociedade civil, são fundamentais para a produção coletiva dos textos finais do plano. Tal processo poderá tornar os planos realidade, pois somente com pressão da sociedade civil problemas de quem ainda não tem voz política (crianças) poderá ser ouvido em meio a tantas prioridades de nossa sociedade. Daí a importância de apoio técnico e força política dentro dos municípios para que esses planos não se tornem letras mortas. Nisso, a mídia pode ajudar muito à mobilização social.
Direito de brincar, de ser cuidado por profissionais qualificados em primeira infância, de ser prioridade nas políticas públicas, além dos direitos a ter a mãe, pai e/ou cuidador em casa nos primeiros meses, com uma licença-maternidade e paternidade justa são alguns dos ganhos definidos no Plano Nacional pela Primeira Infância. Também se estabelece ali o direito a receber cuidados médicos consistentes, especialmente os que estão em condições de vulnerabilidade. Essas são algumas das linhas incluídas e consistem numa vitória que começa a fechar a lacuna entre o que diz a ciência e o que estava na lei, por meio da criação de programas, serviços e iniciativas baseados no desenvolvimento integral das crianças desde o nascimento até os 6 anos de idade.
Concluindo, já há no Brasil a preocupação formal (legal) com a primeira infância, estabelecido em legislação. Falta agora as comunidades, organizadas a nível municipal, forçarem a prioridade para que o que foi estabelecido na esfera federal não se torne mais uma perda de tempo burocrática sem os impactos reais necessários no desenvolvimento do país e na construção da felicidade das gerações futuras.


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