O voto do brasileiro

José Luiz Delgado
Professor de Direito da UFPE

Publicado em: 05/10/2018 03:00 Atualizado em: 05/10/2018 08:44

É de direita ou de esquerda o brasileiro? Vota em qual lado? Talvez  outra coisa, mais do que o elemento ideológico, explique o voto nacional.

Porque parece vir sendo, esse voto, desde a redemocratização, sempre no mesmo sentido. É o voto contra a política tradicional, contra os maus costumes e as más práticas da velha política, contra a corrupção na política e da política. Contra o “sistema”. Pela ética no trato da coisa pública, pela seriedade, pela austeridade, pela elementar honestidade. Voto reiterado, firme, constante. Ao qual, nada obstante, logo em seguida os eleitos não dão atenção. E, muitas vezes, nem percebem que é por isto que foram escolhidos. Somente eles não veem que a grande bandeira brasileira, insistentemente reafirmada, é a do clamor contra a corrupção na política, é o clamor contra os maus políticos, portanto contra eles mesmos.  

Foi assim, clarissimamente, o voto em Collor, o primeiro depois de 1985, o homem da luta contra os marajás – como foi também o do último pleito antes de 1964: o voto em Jânio, o da vassoura, que iria limpar o País, varrer toda a sujeira da política tradicional.

Assim também foi com Fernando Henrique: pareceu que um intelectual seria mais puro, se vinha ele dos livros e das ideias, não das práticas políticas viciadas. E assim também com Lula: o que empolgou o eleitorado, muito mais do que o discurso social que a biografia dele anunciava, foi o sonho de uma política diferente, renovada, uma política com ética. E essa, claramente, foi a grande motivação dos fabulosos protestos de junho de 2013. O Brasil não suporta mais a corrupção dos políticos, venha de onde vier, seja de que lado for. O País não tem “corrupto favorito”.

Todas as vezes o eleitor terminou frustrado. Nenhum daqueles em quem depositou a esperança de uma nova política correspondeu. Mas ele não perde o seu empenho contra a política habitual. Talvez seja isso que justifique o sucesso de um candidato como Bolsonaro. Ninguém mais do que ele parece encarnar a antipolítica, ou seja, a rejeição da política como ela vem sendo habitualmente praticada entre nós – com esse cortejo de trocas, cambalachos, promiscuidades, a que, bestificados, assistimos todos os dias. É a revolta contra a quadrilha – eles não! – que destruiu o Brasil. O brasileiro, que sempre se indignou com a corrupção que suspeitava grassar nos bastidores da política, muito mais agora se indigna com a corrupção desbragada, acintosa, gigantesca que veio assaltando o Brasil na última década.

Por isto mesmo, a falta de alianças partidárias – em consequência da qual seu tempo de televisão e sua participação no fundo eleitoral são irrisórios– termina sendo uma vantagem para aquele candidato, contra quem o “Centrão” e toda a mídia se levanta. Reforça a ideia de que ele, e só ele, representa a aversão a tudo quanto ai está. E é esse clamor por uma nova política que faz com que sejam minimizadas as queixas (procedentes) contra seu destempero verbal e as alegações (ridículas, ambas) de que ele não conhece economia (Lula conhecia?) e representa um perigo para a democracia.

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