Ivo Pitanguy - ícone ou lenda?

Moises Wolfenson
PhD em Cirurgia Plástica, escritor e historiador

Publicado em: 01/10/2018 03:00 Atualizado em: 01/10/2018 08:53

Neste artigo o leitor conhecerá uma lenda da medicina brasileira, o ícone maior da cirurgia plástica mundial contemporânea: Ivo Pitanguy.

Com uma linguagem direta, e com grande entusiasmo, apresento a vida e obra do maior mestre da cirurgia plástica de todos os tempos; e vamos além, contamos em detalhes os momentos mais marcantes de sua vida científica, intelectual e empreendedora, sempre dirigida a minorar o sofrimento das pessoas no sentido de encontrarem no seu semblante o conceito de normalidade.

Um momento importante na vida do nosso mestre Pitanguy foi um episódio trágico ocorrido em Niterói, em 17 de dezembro de 1961, o incêndio do Grand Circo Norte-Americano, provocado por dois faxineiros que foram demitidos do circo, revoltados, atearam fogo na lona com parafina. A parafina era usada para impermeabilizar a lona, na ocasião cerca de duas mil pessoas estavam presentes. Um episódio salvou muitas vidas! No tumulto um elefante saiu correndo,arrastando tudo, inclusive a lona em chamas, esse foi seguindo de uma multidão que escapou ilesa.

O garoto Pablo, de 11 anos, retirado das lonas com 80% do corpo queimado, se desvencilhou das enfermeiras e voltou para o meio do fogo. Minutos depois, reapareceu com um amigo no colo. O caso de heroísmo impressionou o jovem médico Ivo Pitanguy, que participou do resgate e viu o trabalho com os feridos estimular o desenvolvimento da cirurgia plástica no Brasil. Professor da PUC-RJ, Pitanguy ia para um plantão na Santa Casa da Misericórdia quando ouviu, pelo rádio, o anúncio do incêndio. Desviou o carro e seguiu para o Iate Clube do Rio. A bordo de sua lancha particular, atravessou a baía de Guanabara (não existia ainda a Ponte Rio-Niterói) e foi ao encontro das vítimas, quase mil pessoas foram salvas e tratadas pelo jovem médico e sua equipe. É indiscutível que uma das cirurgias mais complexa é aquela realizada em pacientes queimados Os fatos me foram narrados e corroborados com depoimentos emocionados de pessoas que tiveram o privilégio de acompanhar o professor Pitanguy como seu colaborador, amigos próximos ou membros da AEXPI (Associação de ex-alunos de Pitanguy), hoje ilustres mestres da cirurgia Plástica como o dr. Farid Hakme, seu fiel escudeiro.Há, também, relatos e depoimentos de grandes nomes da cirurgia plástica brasileira, inclusive muitos ex presidentes da SBCP – Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica, como os drs. Prado Neto, Luis Carlos Garcia, Pedro Martins, Ewaldo Bolivar, Juarez Avelar que foram seus discípulos diretos e seus grandes amigos . Tivemos o grande privilégio de ter convivido com Pitanguy em diferentes momentos na cirurgia plástica ou fora dela.

Assim, através da medicina e da literatura convivi com um dos mais importantes cirurgiões plásticos do mundo e uma das maiores personalidades do século 20.

Sua humildade e sua inteligência, eram invulgares. Pitanguy atendia sem distinção, desde favelados da Rocinha (RJ) até os coroados, monarcas da Inglaterra, Rainha Elizabeth, e Farah Diba, do Irã.

Transformou-se numa referência mundial, criando técnicas de cirurgia plástica que são seguidas e respeitadas até hoje. Ele também nos contou de seus obstáculos do início da carreira, quando a cirurgia plástica era vista como algo menor; sua passagem por grandes hospitais dos Estados Unidos, França e Inglaterra; a construção de sua clínica em Botafogo, reconhecida e frequentada em décadas por celebridades do cinema, dos esportes e da literatura. Na sua dedicação em atender aos mais necessitados, dando a muitos deles a possibilidade de realizarem cirurgias plásticas restauradoras e estéticas, criou a Fundação Ivo Pitanguy com uma Enfermaria na Santa Casa de Misericórdia no Rio de Janeiro.    

Testemunhei também o entusiasmo magistral pela vida exemplarmente demonstrado pelo seu savoir vivre e savoir faire. Uma lenda real, intensa e repleta de uma luz especial, própria das pessoas geniais.     

Outro aspecto foi conhecer o Ivo Pitanguy também intelectual, com mais de 20 livros publicados, ele foi membro da ABL – Academia Brasileira de Letras, ocupando a cadeira 22. Também usufruímos do seu convívio, da troca de ideias sobre o museu da cirurgia plástica brasileira e outros projetos culturais, a exemplo do livro Um Século da Cirurgia Plástica no Brasil, lançado em 2006, na Academia Brasileira de Letras. Ivo Pitanguy, referência internacional na cirurgia plástica e patrono da cirurgia plástica brasileira. Dessa forma,direi, sem relutar, que existe uma interdependência na cirurgia plástica, entre ciência, arte, cultura e técnica .Isso foi o que me ensinou o prof. Ivo Pitanguy através de sua história de vida e dos conhecimento compartilhados por ele. Felizmente, graças a Deus e a Apolo - divindade da beleza - Pitanguy não é mais um ícone, o professor é uma lenda.

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