Editorial Combinou com o Congresso?

Publicado em: 25/09/2018 03:00 Atualizado em: 25/09/2018 05:37

Ninguém sabe se é fato ou lenda. Mas a história se repete desde então. Na Copa de 1958, o técnico Feola teria imaginado um esquema infalível para derrotar a seleção soviética. Nílton Santos lançaria uma bola pela esquerda. Garrincha driblaria três adversários e cruzaria para Mazzola marcar de cabeça. Dizem que o time ouviu atentamente a explicação. Sobraram sorrisos e aplausos. Destoando do entusiasmo geral, ouviu-se a voz de Garrincha: “Combinou com os russos?”

A campanha eleitoral traz à tona a narrativa do folclore futebolístico. Por uma razão simples, mas importante. As atenções se concentram na corrida presidencial. Em segundo plano, na de governadores. Eventualmente, fala-se na de senadores. Deputados ficam esquecidos como se fossem coadjuvantes no concerto da governabilidade. Esquece-se de que o poder é do Congresso. Independentemente de quem seja, o futuro inquilino do Palácio do Planalto depende dos parlamentares para aprovar as propostas.

O presidente não manda. Ele executa o que deputados e senadores aprovam ou determinam. Sem o aval do Legislativo, fica com as ideias na cabeça e o projeto no papel. Iniciativas urgentes como atacar o deficit fiscal, promover reformas estruturais, melhorar a segurança, a educação e a saúde não passarão de palavras jogadas ao vento. Trata-se de filme que se reprisa com indesejável frequência.

Conclusão: na democracia, o voto para o chefe do Executivo não vale mais do que o voto para representante na Câmara ou no Senado. E, no âmbito das 27 unidades da Federação, a escolha do governador tem o mesmo peso da escolha dos ocupantes da Assembleia Legislativa (Câmara Legislativa, no Distrito Federal).

Sem dar visibilidade aos postulantes, o sonho de renovação do Congresso vai pras calendas gregas. As castas políticas se perpetuarão no poder. É natural. O eleitor não tem o dom de adivinhar que A, B ou C disputam um cargo no parlamento. A tendência é eleger um nome conhecido e, com ele, os velhos vícios tão criticados pelos brasileiros. Por causa da relação incestuosa que se estabelece com o governo e o distanciamento dos anseios populares, a classe política amarga um dos mais baixos níveis de credibilidade nacional.

Em 7 de outubro, serão renovadas 54 das 81 cadeiras do Senado e toda a Câmara dos Deputados. Trata-se de momento ímpar de apostar na mudança — buscar nomes comprometidos com os anseios da população e conscientes da importância do Poder Legislativo. Mas, talvez agora, como em 1958, faltou combinar com os russos. É pena. Mais uma vez, concretiza-se a profecia de Roberto Campos. “O Brasil”, repetia ele, “não perde oportunidade de perder oportunidade.”

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