Folheto de cordel no bagageiro de Marcelino Freire

Raimundo Carrero
Escritor e jornalista
raimundocarrero@gmail.com

Publicado em: 24/09/2018 03:00 Atualizado em: 24/09/2018 08:55

O folheto de cordel sempre exerceu um incrível fascínio na minha vida. Em criança fui embalado pela leitura desses mágicos livrinhos na feira de Salgueiro, onde aprendi com a luta dos seus autores pela divulgação em todos os quadrantes do país. Agora o folheto está sendo reconhecido pelo Instituto do Patrimônio Cultural e Artístico Nacional e alcança grandes momentos, embora já estudado em centros universitários do Brasil e do Exterior.

A notícia nos chega no exato momento em que o escritor pernambucano Marcelino Freire lança o notável Bagageiro, livro que reúne suas reflexões sobre a criação literária com uma linguagem despojada, simples e direta , às vezes irônica, `as vezes austera, sempre deixando o leitor muito à vontade, quase sempre com um sorriso nos lábios , seduzido pela narrativa. Enriquecedor mas não didático, sem o bolor do ensinamento  forçado, o livro está dividido em ensaios, sempre convidando para o simples e  natural. Chega assim a conclusões definitivas como estas: "  Clarice é vírgula. Graciliano Ramos é ponto. Raduan Nassar é ponto e vírgula. Guimarães Rosa são dois pontos." Esta é a linguagem deste livro que é resultado da oficina literária que realiza pelo País sempre acompanhado por alunos devotos.

Mas não é difícil encontrar em Marcelino Freire um forte parentesco com o folheto de cordel, porque é o escritor também nascido com os ouvidos acalentados pelos cordelistas nas feiras de Sertânia, Albuquerque Né e redondezas. Basta ler as suas histórias das gentes simples do interior do Brasil e da facilidade como revela a ironia, possivelmente o seu traço mais característico..

É claro que não usa linguagem matuta, como se costuma dizer, nem opta por construções equivocadas de linguagem, mas revela a força e a imagética do sertanejo expressas no cordel. Por parentesco, apenas por parentesco, nunca por imitação ou por cópia. E porque conhece a linguagem inventiva que nasce no sangue do inventor ou do criador. Nascida, evidentemente, no sangue sertanejo, que nunca negou.

É correto dizer, assim, que tanto Marcelino quanto o folheto de cordel saem fortalecidos, o que nos honra e nos alegra. Esta é, com certeza, uma notável reafirmação da cultura literária nordestina com imensas vantagens para Pernambuco. É claro.

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