Editorial Guerra sem vencedores

Publicado em: 20/09/2018 03:00 Atualizado em: 20/09/2018 08:55

Muitos acusam Donald Trump de vários defeitos. Entre eles, o de ser temperamental, falastrão, mal-educado e politicamente incorreto. Mas amigos e inimigos não lhe negam uma qualidade — a coerência. Na campanha eleitoral, o então candidato fazia promessas que soavam delirantes, contrárias aos princípios da maior potência do planeta e da economia mais aberta do mundo.

O republicano, com gestos bruscos, vocabulário tosco e discurso extemporâneo, dizia ser a pessoa certa para devolver a grandeza que a nação tinha perdido ao longo dos anos. Anunciava medidas excêntricas caso chegasse à Casa Branca. Era o caso da expulsão de imigrantes ilegais, do abandono de acordos internacionais, da construção de muro para separar a fronteira mexicana da americana.

Em menos de dois anos de mandato, Trump disse a que veio. Cumpre à risca o prometido, indiferente às consequências presentes e futuras. Em março, deu início à guerra comercial para pôr fim à ganância dos que exploram os Estados Unidos — mantra que repete à exaustão pelo Twitter. Impôs tarifa de 25% sobre o aço e 10% sobre o alumínio contra vários parceiros. Não poupou a China nem aliados históricos como Canadá e países da União Europeia.

Os atingidos anunciaram medidas retaliatórias, que não inibiram o ímpeto protecionista de Donald Trump. Ao contrário. Ele insiste na ladainha de que acabaram os tempos em que os americanos se tornaram vítimas da ambição internacional. Na segunda-feira desta semana, avançou na guerra comercial com Pequim ao impor a taxação de 10% sobre 5 mil produtos chineses. São números expressivos — US$ 200 bilhões em exportações da nação asiática à potência do Norte.

Com a iniciativa, Washington bateu recorde no comércio internacional — nada menos de 50% das vendas destinadas aos Estados Unidos estão sob retaliação. A resposta chinesa não tardou. O Ministério do Comércio divulgou que US$ 60 bilhões em produtos americanos sofreriam taxação de 5% a 10% a partir da próxima segunda-feira.

A questão longe está de bater ponto final. Trump ameaça com uma terceira rodada de sanções caso a China não interrompa as práticas desleais de comércio e o roubo de propriedade intelectual. A punição: taxar 100% dos produtos chineses que entrarem em território estadunidense. É preocupante. A continuar a escalada de retaliações, especialistas não hesitam em alertar para o perigo de uma recessão global.

Quando a força bruta se impõe, o diálogo bate em retirada. A primeira consequência é a possível suspensão da rodada de negociações preparada por Washington para ocorrer em breve. No confronto entre os dois gigantes, não haverá vencidos nem vencedores. Haverá feridos, que não se restringirão aos contendores, mas se estenderão mundo afora. A redução do crescimento mundial e pressões inflacionárias são fantasmas que assombram os cinco continentes.

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