Editorial Desperdício

Publicado em: 18/09/2018 03:00 Atualizado em: 18/09/2018 08:58

O desperdício de alimentos chega a 1,3 bilhão de toneladas por ano e, se nada for feito, poderá atingir 2,1 bilhões de toneladas em 2030, a um custo anual de US$ 1,5 trilhão. No Brasil, um dos maiores produtores agrícolas do mundo, 5,2 milhões de habitantes passam fome. Ao mesmo tempo, o país alia características de subdesenvolvimento, com perda de um terço no pós-colheita e no escoamento da safra, aos hábitos de nações ricas, com 28% de perda no fim da cadeia e no consumo. A infraestrutura logística precária, o baixo índice de capacitação nas lavouras, a informalidade no transporte, o excesso de manuseio nas redes de varejo e a cultura da mesa farta fazem com que o prejuízo, no Brasil, ocorra em todos os elos da cadeia agrolimentar.

Para especialistas, faltam engajamento, conscientização e o entendimento de que um alimento imperfeito não é descartável. Muitas vezes é até mais saudável porque tem menos agrotóxico. Para que redes supermercadistas e restaurantes se sensibilizem para o problema, é preciso pressão do consumidor. Enquanto isso não ocorrer, o comércio continuará a embutir as perdas no preço de venda. Além de praticar o consumo consciente, o brasileiro precisa ficar atento ao próprio lixo. Uma família joga no ralo em média 20% do que compra de comida porque o faz por impulso, porque venceu o prazo de validade ou porque não houve aproveitamento integral.

As perdas na produção e o desperdício de alimentos aumenta a tragédia social da fome no mundo, que hoje atinge 821 milhões de pessoas, segundo a Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO), mas também têm impacto nocivo no meio ambiente e graves consequências econômicas. A degradação dos alimentos emite tantos gases de efeito estufa quanto todo o parque automotivo do planeta e consome um terço de insumos, com custos que jamais retornarão à cadeia produtiva.

Pesquisa da FGV e da Embrapa, com apoio do projeto Diálogos Setoriais União Europeia —Brasil, revela que o gosto do brasileiro por fartura é o principal responsável pelo desperdício de alimentos na mesa, da qual carnes e arroz são os itens que mais saem direto para o lixo. Segundo o levantamento, feito com 1.764 famílias, 68% dos entrevistados consideram importante que a despensa esteja cheia; 59% não dão importância se houver comida demais; e mais de 60% priorizam uma grande compra mensal de alimentos. Quando a compra farta é combinada ao baixo planejamento das refeições, eleva-se a probabilidade de desperdício.

Só a mudança de hábitos, aliada à implementação das novas tecnologias nos vários elos da cadeia alimentar, é capaz de reverter as perdas responsáveis por danos ambientais, por prejuízos bilionários e, sobretudo, pela tragédia da fome. Conhecer o alimento, utilizá-lo integralmente e acondicioná-lo de forma correta são medidas simples que podem evitar o desperdício. Assim como a doação de produtos imperfeitos (mas com as características nutricionais resguardadas) aos bancos de alimentos ou programas sociais de combate à subnutrição ajuda a mitigar a fome das pessoas mais carentes.

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