Colômbia e Brasil, qual é a tragédia suficiente?

Felipe Sampaio
Chefe da Assessoria de Articulação Institucional do Ministério da Segurança Pública

Publicado em: 12/09/2018 03:00 Atualizado em: 12/09/2018 08:38

Durante missão recente do Ministro da Segurança Pública brasileiro à Colômbia, nossa equipe observou as práticas colombianas para reduzir a criminalidade nas últimas décadas. Fomos a Medellín e Bogotá visitar os bairros palcos da violência dos anos 80, conversar com lideranças comunitárias, encontrar prefeitos, chefes de polícia, secretários de segurança e outros gestores do desenvolvimento social. Estivemos ainda com os ministros colombianos da Defesa e das Relações Exteriores, com o ex-presidente César Gavíria, e visitamos o Escritório da ONU sobre Drogas e Crime.

Arriscando uma comparação entre a Colômbia de 30 anos atrás e o Brasil de hoje, podemos notar algumas semelhanças entre os dois casos, como a ocupação desordenada das favelas, a desigualdade social, a corrupção frequente, quadrilhas do narcotráfico, a ausência do Estado, o desaparelhamento da segurança pública, os problemas de infraestrutura e serviços públicos etc.

Por outro lado, a situação brasileira de hoje difere da Colômbia dos anos 80 em pontos como a ocorrência de grupos guerrilheiros, terrorismo, o apoio dos americanos em dinheiro e inteligência, a grande área rural de produção de cocaína e o intenso êxodo rural concentrado em tão poucos anos nas favelas colombianas.

Vale destacar as atitudes dos colombianos no seu projeto de pacificação. Digo atitudes porque, antes de serem estratégias, tratou-se de uma virada na postura da sociedade colombiana. Falo, por exemplo, da decisão de proporcionar às comunidades mais pobres a mesma qualidade de infraestrutura e serviços públicos que havia nos bairros de classe média. Falo da postura política que possibilitou que as ações fossem mantidas por governos municipais e federais de diferentes partidos.

Refiro-me também às ações conjuntas entre governo e organizações da sociedade civil, especialmente na prevenção da criminalidade e na reintegração dos egressos do tráfico e da guerrilha. Vê-se ainda a implementação de modelos de polícia cidadã, sem descuidar de uma qualificada inteligência policial. Como eu disse antes, é um sistema de iniciativas que representa, mais do que uma estratégia, uma mudança de atitude.

Mas, o que fez os colombianos decidirem dar prioridade à segurança pública? A que ponto as coisas precisaram chegar para que a elite, os políticos, as instituições e as comunidades mais pobres se unissem em favor de uma cultura de pacificação? Talvez a fala do prefeito de Medellín durante nossa estadia na Colômbia revele uma resposta. “Chegamos a um ponto em que ao sair de casa ou da empresa não tínhamos mais certeza de que retornaríamos”. Na época, Medellín tinha um índice de homicídios dez vezes acima da média brasileira atual. Mais do que uma resposta, a fala do prefeito nos oferece outra pergunta. Qual é o nível de tragédia suficiente para que uma sociedade como um todo dê uma virada de atitude em relação aos efeitos, e às causas, da sua violência? É preciso chegar aos 400 homicídios / 100 mil hab?

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