Fortes ventos sobre a democracia

Cláudio Roberto de Souza
Mestrando e professor de história

Publicado em: 12/09/2018 03:00 Atualizado em: 12/09/2018 08:39

No Brasil, pouquíssimos presidentes foram eleitos democraticamente. Na primeira república, entre 1889 e 1930, os presidentes foram eleitos periodicamente, mas não podemos considerar o sistema como democrático. Nele, o voto não era secreto, os eleitores eram apenas de 1% a 5% da população e não havia a possibilidade concreta do candidato no governo perder a eleição, haja vista as fraudes que permeavam o processo. Aí, chegamos em 1930, quando Vargas tomou o poder, após ter perdido a eleição. Em 1934, o mesmo Vargas foi eleito pela Assembleia Constituinte para a presidência e a próxima eleição que deveria ocorrer em 1938 não houve porque Vargas deu o autogolpe do Estado Novo em novembro de 1937, permanecendo no poder até 1945, quando foi forçado a renunciar.

Entre 1946 e 1964 teremos nosso período efetivamente democrático, sob nova constituição. Foi constituído um regime pluripartidário, havia a possibilidade efetiva do governante perder a eleição, pois numa democracia, há de haver a possibilidade concreta de que quem esteja no governo possa vir a perder a eleição. Houve liberdade de imprensa, congresso funcionando e ampliação do percentual de eleitores para cerca de 50% da população. Neste período, foram eleitos por voto direito os presidentes Gaspar Dutra (1946), Vargas (1950), Juscelino (1955) e Jânio Quadros (1960). Jânio renunciou e João Goulart assumiu em 1962 e governou até a crise política que resultou em sua deposição pelos militares em 1964.

De 1964 até 1989, as eleições foram indiretas com cinco generais presidentes. A ditadura civil-militar criou o bipartidarismo, a oposição era desbaratada por cassações de mandato e a legislação eleitoral alterada sempre que o governo sentia que poderia perder uma eleição, além da imprensa ser mantida sob censura. Assim, quem participou das eleições de 1960 com 18 anos, apenas tornaria a votar para presidente com 47 anos! Em outras palavras, ninguém com menos de 47 anos em 1989 nunca havia participado de uma eleição presidencial no Brasil. Fomos uma geração que, literalmente, teve que aprender o que era essa tal democracia. De lá pra cá, elegemos Collor, Fernando Henrique, Lula e Dilma. No meio do caminho, o trauma superado do impeachment de Collor e a ferida aberta do impedimento da presidente Dilma. No balanço do processo, de 129 anos de república, em apenas 48 deles vivemos sob presidentes eleitos democraticamente. Isso explica muito do nosso atual momento e as tentações autoritárias que, infelizmente, assistimos por parte de candidatos e como elas ainda seduzem parte de nossas elites. É que a República, no Brasil, foi poucas vezes sinônimo de democracia.

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