Germaine: romântica, revolucionária e feminista

Luzilá Gonçalves Ferreira
Doutora em Letras pela Universidade de Paris VII e membro da Academia Pernambucana de Letras

Publicado em: 28/08/2018 03:00 Atualizado em: 28/08/2018 09:17

No Museu do Louvre há um retrato dela: uma loura de cabeleira solta, sorriso vago, olhos que parecem desafiar o observador. Conhecida na história como uma mulher que desafiou Napoleão, e, na literatura como a autora de Corinne e de Delphine, romances que têm por personagens centrais duas heroínas românticas, vencedoras, apaixonadas, feministas, que advogam  os direitos do coração contra os preconceitos sociais, e isso no começo do século 19. E mais: escreveu importantes obras de reflexão sobre a influência das artes no temperamento dos povos e nas instituições sociais, em particular sobre a arte e a política da Alemanha, país no qual viveu. E onde encontrou Schiller e Goethe. Germaine Necker, filha de um banqueiro genovês que se tornou ministro de Luís XVI,  nasceu em Paris, em 1766, Com a idade de vinte anos casou-se com o embaixador da Suécia em Paris, o barão de Stael-Hostein. Admiradora de Napoleão, ela se aproxima dele, buscando ser sua musa inspiradora, mas, como diz um crítico, o corso foi “um dos raros homens que permaneceram insensíveis à eloquência apaixonada desta mulher feia mas sedutora” e que não lhe perdoa o interesse pela política. Interesse que lhe valeu um duro castigo: a ordem de se afastar da Paris que ela amava, pelo menos 40 léguas. Assim exilada, ela percorre a Europa, Visita a Alemanha, onde encontra Goethe e Schiller. Refugia-se em Coppet, onde reúne amigos e admiradores como Benjamin Constant, Madame Recamier. E escreve. No livro que intitula Sobre a Literatura, ela analisa as tendências românticas da arte da época, a influência da paixão que deve dominar a razão, a primazia do sentimento, a sede de liberdade que caracteriza o herói romântico. Estuda o chamado “mal do século”, espécie de melancolia, de nostalgia nem sempre motivada, do tédio de viver, e do deslocamento do indivíduo no seio de uma sociedade que não o compreende. A editora da USP acaba de traduzir e publicar Da Alemanha, de Madame de Stael, como se tornou conhecida Germaine Necker. Nesse livro, a autora de Corinne estuda os costumes dos alemães, em comparação com costumes de outros povos, como  franceses e italianos. Analisa as principais épocas da literatura alemã, o estilo e a versificação na língua alemã. Lê alguns dos principais poetas, dramaturgos, filósofos, críticos, historiadores como Schlegel, Kant, Lessing, Goethe e Schiller, entre outros, cujas ideias  e arte tiveram uma ação eficaz sobre as várias sociedades e os vários povos do mundo. Num momento em que a Alemanha atrai a atenção dos povos da Europa e de outros continentes, por suas posições políticas, e por sua atuação face aos grandes dilemas que vivemos, o livro que a Edusp publicou é um grande e indispensável manual para o conhecimento desse país. Tem algumas centenas de páginas e custa cento e dezoito reais – R$ 118 – nas livrarias. Mas o preço vale a reflexão a que nos obriga Madame de Stael, um texto atual apesar de seus mais de duzentos anos. 

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